|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
TENDÊNCIAS/DEBATES
O Pontal do Paranapanema
LUIZ ANTONIO NABHAN GARCIA e SIGEYUKI ISHII
Muito se tem discutido a respeito
das terras do Pontal do Paranapanema, notadamente os conflitos agrários gerados pelos membros do chamado MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), que tentam criar
dúvidas quanto à legitimidade dos títulos de propriedade existentes naquele
pedaço do Estado de São Paulo, forçando, com isso, o governo a promover a
expulsão dos proprietários da região de
suas legítimas propriedades, para dar
lugar aos trabalhadores sem terra.
E aqui cabe a indagação: Seriam esses
proprietários realmente grileiros para
merecer esse tratamento? Para responder é necessária uma breve investigação
histórica a respeito dos primórdios da
colonização daquela região.
A penetração nos sertões do Pontal do
Paranapanema deu-se em meados do
século 17, pelo vale do rio Santo Anastácio, por ocasião da expedição colonizadora chefiada pelo sargento-mor Teotônio José Juzarte (composta de 800 pessoas, entre soldados, homens, mulheres
e crianças), em 1769.
No entanto a colonização ocorreu
anos depois, quando, por volta de 1847,
um grupo de mineiros liderados por José Teodoro de Souza iniciou a ocupação
permanente da região pelo território
que compreende as bacias dos rios Paranapanema, Santo Anastácio e Peixe.
Essa ocupação das terras incultas era na
época tolerada e passou a ser legalizada
a partir da edição da Lei de Terras nš
601, de 1850, promulgada tendo em mira o respeito e a garantia da ocupação
primária da terra. Assim nasceram os títulos de propriedade na região.
Todos os títulos foram registrados nos
cartórios de Registro de Imóveis, bem
como passaram, desde então, a sofrer
desmembramentos, dando origem a diversas novas propriedades, inclusive
mediante contratos de assentamento de
imigrantes firmados pelo Governo Provisório da República.
Sobreveio em 1891 a Constituição da
República, que passou para os Estados
da Federação as terras que ainda se encontravam devolutas. No Estado de São
Paulo, a partir de 1895, foram baixadas
diversas disposições, todas respeitando
a posse da terra desocupada, bem como
estimulando a sua regularização.
No caso do imóvel que ficou conhecido como "Pirapó-Santo Anastácio"
(que abrange parte dos municípios de
Presidente Prudente, Álvares Machado,
Presidente Bernardes, Santo Anastácio,
Presidente Venceslau, Piquerobi, Caiua,
Presidente Epitácio, Marabá Paulista,
Mirante do Paranapanema, Euclides da
Cunha Paulista e Rosana, entre outros),
o seu primitivo registro foi realizado no
ano de 1890 e, no ano de 1900, passou a
integrar o Registro Público das Terras
Públicas e Particulares como imóvel de
caráter particular.
As terras que formam boa parte do Pontal do Paranapanema não são fruto de uma grilagem qualquer
|
No ano de 1910 o governo do Estado
iniciou a ação discriminatória envolvendo todo o território da Alta Sorocabana, inclusive o que ficou conhecido
como Pontal do Paranapanema, sendo
que os títulos lá exibidos, incluindo o
chamado Pirapó-Santo Anastácio, foram considerados legítimos.
A fazenda Pirapó-Santo Anastácio
foi objeto de divisão judicial em 1908,
com a habilitação de mais de 3.000 condôminos, sendo que a Fazenda do Estado de São Paulo, a despeito de citada,
não se interessou naquela época em ingressar no processo.
No transcorrer do último século, diversas comarcas foram instaladas naquele território, tendo o Estado participado ativamente da criação e implantação de serviços públicos, notadamente
os cartórios de Registros de Imóveis,
que deveriam oferecer garantia e segurança de legitimidade às transações lá
registradas.
Em 1945, o governo do Estado legitimou, através de lei, independente de
processo, todos os títulos de propriedade existentes no Estado que estivessem
registrados havia mais de 20 anos, ou
seja, desde 1925. Esse é o caso de todos
os adquirentes de parcelas do imóvel Pirapó-Santo Anastácio.
Resulta, pois, que as terras que formam boa parte do Pontal do Paranapanema não são fruto de uma grilagem
qualquer, que deve agora ser coibida pelo Estado, como podem acreditar os
menos informados; mesmo porque, se
irregularidade nenhuma ocorreu, o Estado de São Paulo contribuiu e muito
com a situação hoje consolidada naquela região, e a sua ação política, no sentido de tentar arrecadar terras com base
numa suposta fraude verificada há muito mais de cem anos, só está atingindo a
terceiros de boa-fé que acreditaram nos
registros públicos instalados e mantidos
pelo próprio Estado.
Conclui-se, pois, que os proprietários
não tiveram participação em nenhuma
prática irregular naquele antigo registro
imobiliário de 1890, sendo na realidade
vítimas dos registros públicos criados e
mantidos pelo governo do Estado.
Luiz Antonio Nabhan Garcia, 44, é presidente
da UDR (União Democrática Ruralista). Sigeyuki Ishii, 63, é presidente do Sindicato Rural de Presidente Prudente (SP).
Texto Anterior: TENDÊNCIAS/DEBATES Hernan Chaimovich: O lugar das universidades públicas Próximo Texto: Painel do leitor Índice
|