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NELSON MOTTA
Tati Quebra-Barraco em Berlim
RIO DE JANEIRO - Não há o que estranhar: ela é feia, mas está na moda.
O funk também é música brasileira e
não é novidade. Novidade é a atenção da grande imprensa e a adesão
da classe média à velha nova onda,
que nasceu nos subúrbios cariocas
nos anos 70.
Mais velha ainda é a reação moralista, que grita sempre que aparece
uma nova dança que alegre, divirta e
mexa com a libido das pessoas. Charleston, tango, maxixe, samba, rock
and roll, mambo, disco, pogo, todas a
seu tempo foram consideradas "dança do diabo", incitação ao sexo e a
perversões, atentatórias aos valores
familiares, à religião e ao Estado. Foi
assim ao longo de um século e certamente as pessoas teriam enlouquecido se não lhes tivesse sido permitido,
ao menos, dançar.
Quem se preocupa com a ameaça
do funk deveria ver que essas jovens
multidões que enchem os bailes e pulam e gritam e suam e se esfregam e
se divertem estão extravasando tensões e raivas e ressentimentos que,
muitas vezes, levam à violência, às
drogas e ao crime.
Protegeriam melhor suas famílias
se estimulassem os bailes, essas panelas de pressão dançantes, onde a sexualidade é o grande alívio das tensões. Agora, se a sua, ou a minha, filha gosta de ser chamada de cachorra, se gosta que o seu garoto lhe de
uns tapinhas e se, além de tudo, esse
garoto não é branco... Mas não é culpa do funk.
A libido dos jovens é exacerbada e
os tempos são violentos. Como eles
dançam, como se vestem e se despem,
a língua que falam, o que gostam,
querem e acreditam são fruto da cultura de rua das periferias das grandes
cidades. Da pobreza e da exclusão
nasceram um ritmo, uma atitude e
uma liberdade sexual que, juntos, ficaram tão gostosos que todos, até a
classe média careta, quer brincar.
É este o filme. O funk é só a trilha
sonora.
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