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ROBERTO MANGABEIRA UNGER
Por que oposição?
Por que opor-se a governo que
ainda parece contar com o apoio e
a esperança da maioria do povo brasileiro? E por que não contentar-se com
a oposição feita pelas forças derrotadas na eleição presidencial de 2002?
A melhor razão para fazer oposição
agora não é lutar contra a política econômica mais nociva aos interesses do
trabalho e da produção que já se executou no Brasil desde o governo do
marechal Dutra. Também não é combater política social que, em vez de capacitar todos e de fortalecer a classe média, prefere os programas "focados
só em pobres" que as autoridades do
Primeiro Mundo recomendam aos
governos do Terceiro.
A razão maior para fazer oposição
está no dever de resistir ao assalto em
curso contra as instituições republicanas e a idéia democrática no Brasil. A
relativa obscuridade desse assalto,
quase invisível aos olhos da nação e
distante das preocupações da população, aumenta-lhe os perigos. Jamais
daremos outro rumo ao Brasil se não
derrotarmos esse ataque contra a república e a democracia, removendo
do poder, pelo voto, os que o desfecharam.
Compõe-se o assalto de dois elementos: um, fincado no imaginário; o
outro, nas instituições e nas práticas.
No imaginário, o assalto é o esforço
de reduzir, de vez por todas, o horizonte da política progressista à humanização daquilo que seria economicamente inevitável. Essa abdicação do
espírito foi consumada por meio de
reviravolta que escarneceu da democracia, enfraquecendo-a. Por mais que
se diga que o PT avisara, em letra miúda, que conduziria o país no figurino
dos mercados financeiros, o eleitorado julgava votar por mudança de
orientação. Foi enganado. E, como os
falsários diziam encarnar a idéia da alternativa nacional, a trapaça ameaça
desmoralizar, ao mesmo tempo, essa
idéia e o voto.
Nas práticas e nas instituições, o assalto é a neutralização das forças que,
em nossa sociedade tão desigual e em
nossa democracia ainda frágil, podem
oferecer contrapeso ao poder central.
A doutrina do governo não é social-democracia nem neoliberalismo. É
simplesmente hegemonia: o poder como meio e como fim. Com uma única
exceção, os partidos progressistas fora
do PT e as vertentes do PT fora do núcleo governante foram reduzidos a
massa de manobra. A mídia, quase toda ela em situação pré-falimentar, foi
quase toda posta de joelhos. Fundiram-se as agências reguladoras, os
bancos públicos e os fundos de pensão
num só instrumento grosseiro de manipulação de negócios. Os grandes
empresários estão mais intimidados e
acocorados de que nunca. Agora o Palácio quer enquadrar os procuradores,
cuja responsabilidade mais importante é enquadrar o Palácio. A próxima
instituição a ser ameaçada com mordaça e tacão será a universidade.
Resistir a tudo isso e reabilitar a idéia
de alternativa nacional são as tarefas
prioritárias na política brasileira hoje.
Não as podem cumprir as forças, batidas em 2002, que já brincavam com
esse fogo antidemocrático e anti-republicano. Só a pode cumprir uma
oposição que, despida de ilusões e de
concessões, porém rica em propostas
e em virtudes, aceite começar do quase nada. E que anuncie ao país, ainda
descrente, que se baterá em 2006 pela
Presidência da República e que a ganhará.
Roberto Mangabeira Unger escreve às terças-feiras nesta coluna.
www.law.harvard.edu/unger
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