São Paulo, sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

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A caravana prossegue

Loteamento do poder no governo Lula atiça interesses do PMDB sobre bilionário fundo de pensão de Furnas

BOA PARTE do PMDB, disse há algum tempo o senador Jarbas Vasconcelos, "quer mesmo é corrupção". O político pernambucano, ele próprio um peemedebista, ressalvou que o mesmo se dá nos demais partidos.
Destaque de uma entrevista recente à revista "Veja", a frase produziu impacto até certo ponto desproporcional, uma vez que não acrescentava nada de inédito às percepções correntes da opinião pública.
Foi qualificada como um "desabafo" pela Executiva Nacional do partido, que emitiu curiosa nota oficial dizendo que não daria "maior atenção" ao episódio. Saída resvaladia, sem dúvida, pela qual se responde que não há nada a responder; seja como for, vencida a passagem, a caravana peemedebista seguiu em frente.
Não se extinguiram ainda os ecos da entrevista, todavia, e eis que surgem outras notícias do trajeto do partido pelas paragens do poder. O PMDB procura assumir o controle da Fundação Real Grandeza, responsável pelo fundo de pensão dos funcionários da Furnas Centrais Elétricas. Trata-se do quinto maior fundo previdenciário do serviço público federal, com uma carteira de investimentos de R$ 6,3 bilhões.
O ministro das Minas e Energia, o peemedebista Edison Lobão, acusa a atual diretoria da fundação de querer perpetuar-se no poder. Suas declarações na última quarta-feira ultrapassaram de longe em estridência as acusações, que tanta celeuma provocaram, de um Jarbas Vasconcelos. "Esse pessoal não quer perder a boca", disse Lobão ao jornal "O Globo", referindo-se aos atuais administradores do fundo. "O que eles querem fazer é uma grande safadeza".
O ministro nega estar agindo em benefício do seu partido. Todavia, no loteamento de cargos empreendido pelo governo Lula, Furnas foi entregue ao PMDB fluminense, e pelo controle do fundo de pensão entram em choque a direção da empresa e os sindicatos dos funcionários.
Diante da movimentação de protesto destes últimos, o presidente Lula decidiu adiar, "por tempo indefinido", as mudanças pretendidas por Edison Lobão. Depois de declarações tão contundentes como as que fez anteontem, o ministro se vê obviamente desautorizado pela decisão presidencial.
De resto, mesmo na hipótese de haver "safadeza" na atual gestão -ponto sobre o qual Lobão não trouxe nada de específico-, eis um problema que diz respeito, sobretudo, aos próprios funcionários de Furnas.
O Fundo Real Grandeza foi objeto, no passado, de gestão temerária, investigada pela CPI do Mensalão. Seus recursos, segundo o relatório da CPI, ajudavam a financiar o chamado "valerioduto". A diretoria responsável pelo escândalo foi destituída em 2005. O precedente já bastaria para repudiar-se nova ingerência partidária sobre a instituição.
Uma carteira bilionária foi construída com recursos dos trabalhadores; ninguém concedeu procuração ao PMDB e a seus prepostos para geri-la. Muito menos, vale dizer, em nome da moralidade administrativa.


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