São Paulo, sábado, 27 de março de 2004

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JUSTIÇA À DISTÂNCIA

O Judiciário é um Poder que, por sua própria natureza -que é a de defender o "statu quo"-, tende a ser conservador. É natural e desejável que assim seja. Seu convencionalismo costuma ser compensado pela propensão natural de legisladores e administradores a propor e implementar mudanças. O apego da Justiça ao já estabelecido não deve, porém, constituir-se em obstáculo à adoção de inovações que possam ser úteis.
É bem-vinda, portanto, a disposição do Judiciário e do governo paulistas de ampliar a experiência de realizar audiências com presos e testemunhas por sistemas de videoconferência. O projeto é polêmico e conta com a oposição de instituições respeitáveis como a Ordem dos Advogados do Brasil, que considera a presença física do julgador diante do réu fundamental para o processo.
É um argumento a ponderar, mas não o único. Levar presidiários para ser ouvidos nos fóruns constitui uma verdadeira operação de guerra, que acarreta riscos para a segurança da população bem como ônus econômicos. O governo do Estado calcula que R$ 245 milhões tenham sido gastos em 2003, com 98 mil escoltas que mobilizaram 279 policiais. O aluguel do equipamento para montar dez salas de teleaudiência em dez penitenciárias sairia por cerca de R$ 360 mil ao ano.
É o caso, portanto, de fazer uma experiência mais ampla com as teleaudiências. Se se constatar que a prática facilita a coação do preso ou fere seus direitos legais, é preciso ter a coragem de voltar atrás e retornar ao sistema antigo. Não há economia financeira que justifique negar a cidadãos seus direitos fundamentais. Em princípio, não será muito difícil detectar eventuais abusos, pois os advogados de defesa teriam todo o interesse em divulgá-los.
O fato insofismável é que o Judiciário, num momento em que se fala em reformas e combate à morosidade, não pode rejeitar inovações tecnológicas capazes de auxiliá-lo. Ser um Poder naturalmente conservador não significa manter-se arcaico.


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