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FERNANDO DE BARROS E SILVA
Governo no trono
SÃO PAULO - As imagens do presidente da República e da ministra
da Casa Civil nunca antes na história deste país haviam sido usadas
para vender papel higiênico. Alguém poderá dizer que a primeira
vez a gente nunca esquece...
Parte dos leitores já deve ter conhecimento do enredo da propaganda que começou a ser veiculada
pelo rádio: uma voz que imita Lula
se põe a elogiar aspectos do PAC.
Ele passa a palavra a Dilma e estranha sua ausência. A voz dela então
ecoa lá do fundo: "Alfreeeeeedo!!!!".
Lula retoma a cena e faz o resto do
serviço: "Nunca antes na história
deste país o povo teve tanta maciez", diz o locutor, entre batatadas.
O bordão já é bem conhecido. Na
versão original, a peça publicitária
tinha a intenção de reforçar o exclusivismo social do consumo: era
macio porque era para poucos. Agora, o papel higiênico da madame está ao alcance do povo -é essa a nova
mensagem, suave como lixa. Alfredo virou o mordomo da classe C.
Tudo isso, porém, acaba ficando
em segundo plano, ofuscado pela
escatologia a que são arrastadas as
autoridades da República. A percepção de que há algo ofensivo em
relação aos personagens se impõe:
Dilma está -vamos dizer assim-
"se lixando" para o PAC. Como deixar de fazer associações desse tipo?
É improvável, no entanto, que a
propaganda tenha a mão de algum
gênio tucano mal intencionado. A
explicação aqui parece ser outra. O
jornalista Marcio Aith mostrou na
segunda-feira que grandes empresas e bancos transformaram o governo e o presidente em garotos-propaganda. Há uma onda ufano-lulista na publicidade brasileira.
Se o PAC foi parar no banheiro e
Dilma virou atriz-camelô de produtos delicados para as massas, não é
só porque o governo é muito popular. Fazendo piadas, revelando intimidades, dizendo impropriedades,
Lula criou um ambiente público
que acolhe e estimula esse tipo de
abuso vulgar. A avacalhação costuma jogar a seu favor. Desta vez, a liturgia do cargo foi pela privada.
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