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São Paulo, sábado, 27 de dezembro de 2003

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CARLOS HEITOR CONY

O hábito que faz o monge

RIO DE JANEIRO - Mania antiga de imitar países mais desenvolvidos, não no que têm de bom ou melhor, mas de discutível e absurdo, o Brasil pode adotar o recente decreto do presidente Chirac, que proibiu o uso de símbolos ou vestimentas religiosos nas escolas públicas da França.
O Estado de lá separou-se da igreja logo nos começos da Revolução Francesa, e o Brasil fez o mesmo quando proclamou sua República. Tudo bem. Tirante escolas, hospitais e estabelecimentos particulares, que podem e devem usar seus respectivos símbolos, o Estado se obriga a ser neutro, evitando cruzes, imagens de santos, estrelas-de-davi ou qualquer outro tipo de expressão religiosa.
Até aí, tudo bem. Agora, impedir, como quer o presidente da França, que um cristão, um muçulmano, um judeu usem sua cruz, seu véu ou seu kipá é uma violação do direito individual de se expressar. Proibir uma roupa de pai-de-santo, ou no caso raro de um budista seu manto cor de laranja, é uma violação do direito individual, desde que não implique um ostensivo proselitismo religioso.
Evidente que uma escola pública deverá proibir um pagador de promessas, como o Zé do Burro do filme homônimo, de adentrar o colégio com uma enorme cruz às costas. A mesma coisa poderá ocorrer com o filho de um santo do candomblé, vestido a caráter, tocando o tambor ritual na sala de aula. Mas o uso de uma cruz, inclusive como simples bijuteria -no mesmo caso a estrela-de-davi ou as fitinhas do Senhor do Bonfim-, não pode ser proibido em nome do Estado leigo.
Além disso, há pessoas que por motivos religiosos ou ideológicos adotam símbolos ou vestimentas especiais, e até mesmo por simples superstição. Penso no poeta Thiago de Mello, que, após viver como um dândi sofisticado aqui no Rio, deu uma guinada existencial e só se veste com uma roupa branca, elegantíssima por sinal, que leva o seu recado de paz e concórdia aonde quer que vá.


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