São Paulo, quarta-feira, 28 de janeiro de 2004

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PELO FIGURINO

Embora o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Luiz Fernando Furlan, tenha tomado a precaução de dizer que não pretendia dirigir críticas à política econômica do governo, os comentários que fez anteontem na Índia contrastam com as últimas medidas do Banco Central e colocam na berlinda a ortodoxia econômica até aqui professada pelo Ministério da Fazenda.
Segundo Furlan, os juros no país atingiram patamares tão elevados que "se perdeu a noção do que é razoável". O Brasil, disse o ministro, precisará ajustar sua taxa básica de juros e também os "spreads" cobrados pelos bancos (a margem bruta de rentabilidade nas operações de crédito) aos padrões internacionais. As observações foram feitas poucos dias depois da desastrada decisão do BC de manter a taxa Selic em 16,5%, sancionando os juros mais elevados do planeta. Na Índia, segundo Furlan, a taxa anual para financiamento de automóveis está em torno de 6% -enquanto no Brasil ela é de 37%.
Outras comparações com a economia indiana, também destacadas pelo ministro, parecem relativizar políticas defendidas pelas autoridades econômicas brasileiras em harmonia com os mercados financeiros e o Fundo Monetário Internacional. Os acordos firmados com o FMI não enfatizam a acumulação de reservas cambiais e impõem metas elevadas de superávit primário das contas públicas. O objetivo é assegurar o pagamento dos juros da dívida, cuja relação com o PIB é considerada excessivamente alta. Reduzir essa relação é uma obsessão da Fazenda para que o país possa supostamente merecer o "investment grade", que é a melhor classificação de risco no ranking das agências internacionais.
Pois a Índia já possui essa cotação, tendo acumulado reservas de US$ 100 bilhões (contra US$ 17 bilhões do Brasil), com uma dívida pública equivalente a 85% do PIB (a do Brasil está em 58%) e nenhum superávit fiscal. A economia indiana tem crescido a taxas de 6% ao ano, enquanto no Brasil discutem-se as chances de uma expansão de 3,5% depois de um ano de crescimento zero. Como disse o ministro Furlan, já está na hora de o Brasil, que tem feito tudo "by the book" (como manda o figurino), passar para uma nova etapa.
Ou então mudar de figurino.


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