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São Paulo, sábado, 28 de junho de 2003

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CLÓVIS ROSSI

A verdadeira UTI

SÃO PAULO - Seria de causar indignação, não estivéssemos quase todos já viciados, a afirmação do ministro Antonio Palocci Filho, referendada pelo presidente da República, de que o país saiu da UTI.
Pelo amor de Deus, ministro, ligue a televisão, pelo menos.
De que UTI estamos falando? Se for apenas das mandracarias dos mercados financeiros, tudo bem. Pode até ser que o Brasil esteja saindo dela. Mas, se estamos falando de vida real, francamente, ministro, o Brasil está hoje mais perto do necrotério do que da saída da UTI.
O senhor se deu ao trabalho, ministro, de ler as estatísticas de desemprego? De queda de renda? Ou o mais recente levantamento do IBGE sobre a concentração de renda, que continua obscenamente desigual neste país faz 500 anos?
O senhor acredita, honestamente, que o seu governo fez, até agora, algo que possa, mesmo num futuro remoto, mudar essa obscenidade, que é, bem-feitas as contas, a chaga principal que levou o país à UTI?
Ou o senhor acredita que a molecada do JP Morgan que faz os cálculos de risco-país é que realmente sabe quais são os problemas da pátria?
Admitamos, vá, só para não aborrecê-lo muito, que tudo o que foi feito até agora era necessário, indispensável, bonito, lindo, em face da famosa "herança maldita". Daí, no entanto, a dizer que o país saiu da UTI é ofender a massa de gente que se mata, dia após dia, atrás da perspectiva de um emprego de gari (não do emprego propriamente dito), representantes típicos de uma penca de pessoas que, ou estão desempregadas, ou temem perder o emprego.
Para não falar em todas as demais filas -do INSS, dos hospitais públicos, de um ensino de baixa qualidade, da violência-, enfim, de todas as verdadeiras doenças da pátria. UTI, ministro, é isso tudo, não é o dólar nem o risco-país.


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