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São Paulo, sábado, 28 de junho de 2003

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TENDÊNCIAS/DEBATES

O pacote de microcrédito do governo terá efeito relevante sobre a economia?

SIM

A Caixa fará o seu papel

JORGE MATTOSO

As medidas anunciadas pelo presidente da República não foram dirigidas exclusivamente à Caixa. São novas normas e regras destinadas a todo o sistema financeiro, visando democratizar o acesso popular aos bancos e ao crédito. Esse processo é a primeira iniciativa para assegurar direitos de cidadania a milhões de brasileiros sem nenhum vínculo com o sistema bancário. Ao reduzir a exclusão de trabalhadores informais, de micro e pequenas empresas e, especialmente, da população mais carente, servirá também para gerar renda e oportunidades de trabalho.
Essas novas regras, abertas a todos os bancos, buscam ampliar o acesso à conta corrente, sem burocracia, oferecer recursos capazes de aumentar o crédito à população de baixa renda e favorecer a abertura de cooperativas de crédito.
Os impactos econômicos e sociais dessas medidas não se darão apenas pela ação isolada da Caixa, ainda que, por suas dimensões, ela seja importante, inclusive pela maior concorrência introduzida no mercado. Elas se darão mais intensamente na medida da adesão dos demais bancos às novas possibilidades abertas. Conforme a ampliação da bancarização e da oferta de crédito forem também assumidas por outros bancos, os multiplicadores de renda e de moeda aumentarão mais. Haverá, então, um significativo impacto macroeconômico.
A Caixa é um banco público presente em todos os municípios brasileiros e que apresenta rentabilidade e equilíbrio econômico-financeiro. Como banco comercial, tem hoje mais de 22 milhões de contas de poupança e cerca de 4 milhões de contas correntes. Sua atuação no desenvolvimento urbano é responsável por mais de 90% do financiamento à habitação e pela maioria do financiamento ao saneamento. A Caixa transfere anualmente à população mais pobre cerca de R$ 260 milhões de benefícios dos programas sociais e mais de R$ 350 milhões anuais a programas públicos de educação, cultura, esporte e seguridade social advindos da arrecadação das loterias.
A Caixa fará o seu papel. Há três semanas lançamos a conta Caixa Aqui. Essa conta, simplificada e desburocratizada, já permitiu que mais de 200 mil pessoas tivessem, pela primeira vez em suas vidas, uma conta corrente. Pretendemos alcançar, antes do final do ano, 500 mil novas contas Caixa Aqui.
Em um segundo momento, milhões de "cartões do cidadão", para transferência de benefícios sociais, terão a possibilidade de se transformar em "cartão de débito e de microcrédito". A Caixa paga, anualmente, o montante de R$ 38,8 bilhões, por meio de fundos e programas como FGTS, Previdência Social, Abono Salarial, PIS/Quotas e Rendimentos, Seguro-Desemprego, Bolsa-Escola, Bolsa-Alimentação, Bolsa-Renda, Auxílio-Gás, Programa de Erradicação do Trabalho Infantil e Agente Jovem.
Com o "funding" gerado pelo direcionamento de 2% dos depósitos à vista, poderemos iniciar, dentro de 60 dias, um amplo programa de crédito rotativo pré-aprovado de R$ 200 com taxas de juros baixas (em torno de 2%). Na Caixa, esse programa de crédito será dirigido inicialmente aos clientes com mais de três meses da conta Caixa Aqui e aos detentores de contas-poupança com valores de até R$ 100. Muitos dos futuros demandantes desse programa estão hoje devendo juros de até 400% ao ano, cobrados por empréstimos aceitos no desespero de situações-limite.
Poderão ainda ser implementadas linhas de financiamento com empréstimos de valores pequenos e taxas de juros reduzidas, para microempreendimentos, em conjunto com programas de capacitação profissional (e educação básica), extensão de rede de saneamento, construção de habitação, hospitais e postos de saúde, escolas etc.
Com crédito mais farto e mais barato, a variação inicial nos gastos financiados provocará um incremento primário sobre a renda daqueles agentes econômicos que são recebedores desses gastos. Haverá, então, uma multiplicação da renda e do emprego.
Vale ainda citar o caráter precursor do novo fundo de investimento, a ser lançado em breve pela Caixa, em evento na Bovespa. Ele se inclui no Programa de Incentivo à Implementação de Projetos de Interesse Social, também lançado nesta semana pelo presidente Lula. Trata-se de uma ação integrada entre o governo federal, governos estaduais e municipais, em parceria com investidores privados. Por meio dos Fundos de Investimento em Direitos Creditórios, lastreados em recebíveis imobiliários, ou de Fundos de Investimento Imobiliário, poderão ser construídos bairros completos, com casas, área comercial, saneamento básico, energia elétrica, gás, telecomunicações, serviços de transporte, escolas e centros de saúde. Esses fundos estarão entre os mais modernos instrumentos de securitização existentes no país, com amplo acesso para o investidor, independentemente de ser ele pessoa física, jurídica ou institucional.


Jorge Eduardo Levi Mattoso, 53, professor licenciado do Instituto de Economia da Unicamp, é presidente da Caixa Econômica Federal. Foi secretário de Relações Internacionais do Município de São Paulo (gestão Marta Suplicy).


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