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CARLOS HEITOR CONY
O Barba Roxa e o Arruda
RIO DE JANEIRO - Estava em Salzburgo, acompanhando o festival que
lá se realiza, peguei o carro, atravessei a fronteira da Áustria com a Alemanha e dei um pulo em Obersalzberg. Queria ver a formidável montanha Untersberg, famosa nas sagas
germânicas. Uma lenda garante que
nas suas entranhas, no seu ventre de
pedra e neve, o imperador Frederico
1º ali está dormindo o seu sono de
muitos séculos.
Verdadeira ou não, a lenda inspirou outros imperadores que tudo fizeram para realizar o sonho expansionista de Frederico 1º, que entre outras coisas, devia ter uma barba roxa,
pois passou para história oficial como o Barba Roxa.
Pulando de Obersalzberg para o
campo do Vasco da Gama, aqui mesmo, na rua São Januário (RJ), tivemos a lenda do sapo do Arruda, sobre
a qual já escrevi algumas vezes. Um
torcedor do São Cristóvão, chamado
Arruda, ficou indignado com a surra
que o Vasco deu no seu time: 12 a 0.
Apesar de habituado a derrotas, Arruda achou que era demais.
Alta noite, pulou o alambrado do
campo adversário, enterrou um sapo
mumificado no círculo central, murmurou algumas palavras cabalísticas
para reforçar os efeitos malignos do
sapo e deu o fora.
Durante os anos seguintes, o Vasco
passou a perder todas as partidas que
jogava em seu campo. A diretoria
consultou-se em tendas especializadas, tomou conhecimento do sapo,
contratou escavadeiras, arrebentaram todo o gramado, não houve ossinho de galinha que escapasse da varredura. E o Vasco voltou a ganhar
quando jogava em casa.
Com o exemplo do Barba Roxa e do
Arruda, fico pensando onde estará
enterrada a mandinga que nos inspire a altos destinos ou nos entrava em
nossos caminhos. Olho a pedra monumental do Pão de Açúcar, examino com atenção a rocha colossal do
Corcovado, aqui em frente da minha
varanda. Tento descobrir alguma
coisa dentro delas. Não deve haver
nenhum imperador ali, dormindo
um sonho majestoso e secular. Sou
mais o sapo do Arruda.
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