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São Paulo, quinta-feira, 28 de agosto de 2003

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CLÓVIS ROSSI

A deserção final

SÃO PAULO - Para estabelecer que Luiz Inácio Lula da Silva não é nem nunca foi de esquerda não é preciso recorrer à sabedoria do notável sociólogo Chico de Oliveira. Até eu já tinha percebido.
Daí a tomar o rótulo de "esquerdista" como algo ofensivo, como se quisesse dele se livrar, vai uma imensa distância, que Lula percorreu alegremente, ao responder em Caracas a uma pergunta de Eliane Cantanhêde, desta Folha.
É triste. Não porque a esquerda seja melhor que a direita. Mas porque, se é verdade que Lula jamais foi de esquerda, toda a sua retórica, todos os seus aliados até 2002, quase todas as suas propostas eram de esquerda.
Triste também porque, no Brasil e na América Latina, desgraçadamente, dá vergonha ser de direita, não de esquerda.
Para descrevê-la com competência, recorro ao economista Paulo Guedes, que se define como liberal-democrata e que, portanto, na distribuição convencional de rótulos, seria de direita.
Escreve ele para a mais recente edição da revista "Insight Inteligência":
"[Na América Latina], ela [a direita] é autoritária, corrupta, ditatorial, oligárquica, patrimonialista, sem-vergonha, assaltante oficial de Estado. Nunca teve nenhuma ideologia liberal-democrata. Patrocinava golpes militares, produzia avanços de empresas estatais de intervencionismo generalizado (...)".
Ninguém pense que o resto do texto é um elogio, ao menos por contraposição, à esquerda. Ao contrário, leva pancadas uma atrás da outra.
Lula poderia perfeitamente defender a esquerda, nem que fosse por oposição a tudo isso que a direita representou e representa no Brasil. Ou por falta de culpa nos desmandos praticados, porque a esquerda de verdade jamais teve o poder. Preferiu inscrever-se na longa lista dos adoradores do "esqueçam o que escrevi" (e, de quebra, esqueçam também o que disse, o que fiz e os amigos que tive).


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