São Paulo, domingo, 28 de agosto de 2011

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Obama, Dilma, economia e política

LUIZ GUILHERME PIVA

Embora acertem no factual, as análises relativas a Obama e Dilma erram ao abrigar a ideia de que comando político e negociação são incompatíveis


Todas as análises atestam a derrota de Obama ao ceder às exigências dos republicanos para aumentar o limite da dívida. Mas poderia ser diferente? Não vale recuar e responder com "se, no início, ele tivesse feito isso ou aquilo".
Devem-se ter em conta a maioria republicana na Câmara, a iminência do calote e as condições políticas que faltavam a Obama, enfraquecido por seu insucesso ou inação na recuperação da economia -afinal, ele foi eleito para superar a crise do governo republicano.
Ou seja, a alternativa à derrota seria um confronto com impactos duros para o mundo todo, a começar pelo próprio governo Obama.
Mas vejo ainda um outro aspecto. As mesmas análises falam de irresponsabilidade e radicalismo dos republicanos. Com isso, dividem as perdas políticas: uma parte para Obama, outra para os republicanos. Daí emerge uma ponta de vitória do presidente, calculada ou não.
Seus opositores podem tê-lo desgastado, mas ingressaram no rol dos responsáveis pela decisão tão criticada. E terão consequências.
Haverá mudança na repartição de culpas que Obama carregava sozinho pela crise. Agora, os dois lados chegarão desgastados -dado o provável fracasso das medidas- à eleição de 2012, o que será uma boa melhora na atual posição de Obama. No caso, bem menos provável, de sucesso das medidas, os ganhos serão também repartidos, e o que se chama hoje de pusilanimidade de Obama poderá ser analisada como gesto de alguma inteligência -involuntária que seja.
No caso da presidente Dilma, as análises elogiam, em alguns casos, sua postura rígida e sua recusa às barganhas e pressões de alguns aliados. E criticam, em outros casos, sua suposta leniência diante de outras forças aliadas, às quais faria concessões em excesso.
Discordo. Há, nessa leitura, confusão entre rigidez e comando político e entre leniência e negociação.
Diferentemente de Obama, Dilma foi eleita em função da confiança do eleitorado na continuidade da economia. E ela tem atuado nesse sentido, fazendo uso de ações estatais na dinamização da atividade e nos programas sociais com bons resultados. Esse quadro lhe dá apoio social e força para dialogar com o mundo político e partidário.
Ao mesmo tempo, é do apoio social e dos atores políticos que ela obtém força para atuar na economia e seguir obtendo bons resultados. Observe-se, a propósito, que, desde a queda do ministro Palocci, a presidente assumiu diretamente a articulação política.
Embora acertem muito no factual, as análises relativas a Obama e Dilma erram ao abrigar a ideia de que comando político e negociação são incompatíveis. Daí a minha discordância. A meu ver, os casos de Obama e de Dilma mostram que comando político e negociação são, mais do que compatíveis, reciprocamente necessários.

LUIZ GUILHERME PIVA, economista, doutor em ciência política pela USP, é diretor da LCA Consultores e autor dos livros "Ladrilhadores e Semeadores" (Editora 34) e "A Miséria da Economia e da Política" (Manole).

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