São Paulo, Terça-feira, 28 de Setembro de 1999
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Calaboca

ELIANE CANTANHÊDE

Brasília - Como dizem os sábios, ou espertos, ou prevenidos, ou sei lá o quê, "o pior vem sempre depois".
É isso que apavora no caso da cassação de Hildebrando Pascoal e da prisão dele e da sua turma lá do Acre.
Até aqui, o script vai bem. Ele foi acusado, cassado e está vendo o sol nascer quadrado em Brasília, junto com 26 outros amiguinhos e parentes. E depois?
Está em andamento uma revolução no Acre, doída, devagar, mas bem-sucedida. Ela começou com a luta pela defesa do meio ambiente e da dignidade das pessoas, resultou no assassinato de seus líderes e literalmente ganhou mundo com o de Chico Mendes, em 22 de dezembro de 1988.
Desde então, muita coisa aconteceu de positiva no Acre, inclusive uma fantástica renovação política. Mas todo o cuidado ainda é pouco. O Estado continua violento, Hildebrando está muito vivo, dá um arrepio pensar no que ele pode fazer para se vingar de adversários e testemunhas.
Convém centrar o foco no procurador da República Luiz Francisco Fernandes de Souza, 37, que denunciou a quadrilha, e no ex-bispo de Rio Branco d. Moacir Grechi, que depôs contra ela na CPI do Narcotráfico. Eles são dois grandes vitoriosos no desfecho. Podem, portanto, ser suas maiores vítimas. Como eles, há dezenas.
Pelos relatos, há um clima de euforia no Acre, entre políticos incorruptíveis, procuradores honrados, religiosos que vão à luta, ONGs estrangeiras e jornalistas independentes. A "fauna", enfim, que foi salva por Chico Mendes e agora trata de salvar o Estado.
A euforia, entretanto, é mesclada com o medo. Medo da impunidade final, de retaliações, de uma vingança sem fim de quem não costuma ter limites para executar sua vingança.
O Acre, como vem sendo dito e repetido aqui, é um exemplo. Mas é também uma responsabilidade para o resto do país. Todo o cuidado é (mesmo) pouco. E esse cuidado transcende em muito as fronteiras do jovem Estado.


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