São Paulo, domingo, 28 de outubro de 2007

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Acordo fiscal Brasil-EUA

FRANCISCO DORNELLES


Brasil e EUA examinam a possibilidade de reabrir negociações para um acordo fiscal para eliminar a dupla tributação da renda


O BRASIL e os Estados Unidos examinam novamente a possibilidade de reabrir negociações visando a assinatura de um acordo fiscal para eliminar a dupla tributação da renda.
A dupla tributação existe quando a mesma renda, de uma mesma pessoa, física ou jurídica, é tributada pelo mesmo imposto em dois países. Ocorre quando os países envolvidos no processo de geração e transferência de renda adotam diferentes princípios para definir sua soberania fiscal.
Três são os princípios definidores do poder tributário no que tange ao Imposto de Renda.
Pelo princípio da nacionalidade, os nacionais devem pagar ao fisco de seu país Imposto de Renda sobre todos os rendimentos que recebem, independentemente do país em que têm domicílio ou residência ou do local onde o rendimento auferido foi produzido.
Pelo princípio da residência, o contribuinte deve pagar Imposto de Renda no país onde tem residência ou domicílio, sem que seja levada em conta a sua nacionalidade e o local onde os rendimentos foram produzidos.
O princípio da fonte, que é o terceiro, atribui o poder de tributar a renda de uma pessoa ao Estado em cujo território os rendimentos foram produzidos, não considerando nacionalidade ou residência do beneficiário.
Os Estados Unidos e o Reino Unido adotam cumulativamente os três princípios. O Japão, o Canadá e a maioria dos países da Europa, bem como o Brasil, não recorrem ao princípio da nacionalidade, adotando cumulativamente os princípios de residência ou domicílio e o da fonte.
Para evitar que uma pessoa física ou jurídica seja tributada em dois países pela mesma renda -dupla tributação- são utilizados principalmente o método da isenção e do crédito.
Pelo primeiro, um determinado país isenta de imposto os rendimentos recebidos de outro país por seus residentes e domiciliados. Pelo método do crédito, o país tributa os rendimentos que seu residente recebeu do outro país, mas permite que, do imposto que lhe é devido, seja deduzido o que foi pago no país onde o rendimento foi auferido. Nesse método, existe ainda o instituto do "tax sparing", que leva um país a tributar a renda que um residente seu recebe de outro país, mas permite uma dedução fixa sempre maior que o imposto pago no país onde o rendimento foi obtido.
Nos acordos firmados pelo Brasil com os países exportadores de capital -Canadá, Japão, países da Europa ocidental-, todos eles concordaram em isentar do imposto os lucros e dividendos que suas empresas e pessoas físicas recebem dos investimentos feitos no Brasil. Nos casos dos demais rendimentos, juros, royalties, assistência técnica e serviços técnicos, os referidos países tributam, mas concedem crédito de 25% do rendimento que é superior ao imposto pago no Brasil ("tax sparing"), o que contribui para reduzir o custo do dinheiro e da tecnologia importados.
No período de 1970 a 1984, várias negociações foram desenvolvidas com os EUA visando a assinatura de acordo para evitar a dupla tributação de renda. Não foram concluídas pois esse país nunca aceitou conceder ao Brasil o mesmo tratamento fiscal -isenção e crédito fictício- concedido pelos países exportadores de capital antes mencionados. Acresce ainda o fato de que, como a legislação norte-americana concede, de forma unilateral, um crédito pelo imposto pago no Brasil, não existe dupla tributação da renda entre os dois países de modo a prejudicar o fluxo de investimentos.
O acordo tributário com os EUA só se justifica caso esse país concorde em inserir cláusulas que estimulem o investimento norte-americano no Brasil ou que reduzam o custo do dinheiro e da tecnologia importados, tal como fizeram Japão, Canadá e os países da Europa ocidental.
Os negociadores do acordo para evitar a dupla tributação com os EUA têm um grande desafio. Caso firmem com os EUA um acordo fiscal em que não sejam inseridas cláusulas de tratamento mais favorecido que o Japão, o Canadá e os países da Europa ocidental incluíram nos acordos que fizeram com o Brasil, todos esses países vão solicitar a revogação dos acordos para eliminar a dupla tributação da renda assinados com nosso país, o que vai anular o trabalho desenvolvido nos últimos 25 anos e afetar enormemente o fluxo de investimentos externos desses países para o Brasil.
Os negociadores brasileiros têm diante de si uma grande responsabilidade.


FRANCISCO OSWALDO NEVES DORNELLES , 72, advogado, doutor em direito financeiro pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), é senador da República pelo PP-RJ e vice-presidente nacional de seu partido. Foi ministro da Fazenda (1985), da Indústria, Comércio e Turismo (1996-1998) e do Trabalho e Emprego (1999-2002).

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