São Paulo, terça-feira, 29 de janeiro de 2002

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CARLOS HEITOR CONY

O efeito Fujimori

RIO DE JANEIRO - Nota-se que o presidente da República está à vontade quando o assunto é a sucessão dele próprio. Encarna o papel de magistrado com desenvoltura, a mesma que lhe falta quando se trata de outros temas e problemas. Sua habitual saída, então, é enrolar o que já está enrolado.
Na semana passada, mais uma vez ele atuou como o magistrado íntegro e isento, lembrando aos partidos que a hora não é de agredir, mas de agregar. Tudo bem. Toda hora deveria ser assim, destinada à união.
Donde lhe vem tanta e tamanha naturalidade? Agregar é, em última análise, derrubar qualquer tipo de divisão. Traz embutida a negação do ""partido", uma vez que os partidos agregados resultariam no todo, no bolo gostoso da unanimidade.
E qual seria esse todo, essa unanimidade que juntaria os partidos da situação num único e bastante candidato? A coisa ainda está informe, parece até impossível. No Peru, ao final de seu segundo mandato, quando tudo lhe parecia perdido, Fujimori pedia todos os dias a união dos partidos que o sustentavam.
E tanto Fujimori pediu que obteve uma união em torno dele próprio. Partiu então para obter do Congresso o terceiro mandato, que deu no que deu, na base de que não se pode enganar todo mundo por todo o tempo.
Lembrar os pronunciamentos de Fujimori naquele final de segundo mandato não é pinimba descabida. Tudo se repete, principalmente o que não se deveria repetir. Ignoro se ele usava o verbo ""agregar" -na realidade, meu portunhol não é bastante para isso.
FHC apela acaciamente para a união em torno dos ""lídimos interesses da nação". Ele aceita a fatalidade da candidatura de Lula, mas deseja agregá-la de alguma forma à receita do bolo que vai para o forno. Se colar, colou. O distanciamento presidencial na questão sucessória revela que a esperança será a última a morrer.



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