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![]() São Paulo, quarta-feira, 29 de janeiro de 2003 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES A educação do novo presidente
MOISÉS NAÍM
Encabeçar um grupo de países ""amigos da Venezuela" foi uma boa idéia do presidente Lula. Tentar excluir os Estados Unidos desse grupo reflete apenas a ingenuidade de um governo novato. Embora a reputação internacional dos EUA de Bush não seja das melhores, sua influência é das maiores. Outro aprendizado importante tirado dos gestos iniciais do governo Lula em direção à Venezuela é que as categorias tradicionais já não são muito confiáveis. Nos tempos em que vivemos, a ideologia é má conselheira. Um olhar menos ideologizado sobre a situação vigente na Venezuela revela que Chávez preside um governo eleito democraticamente e que discutiu temas importantes e por muito tempo ignorados pelas elites venezuelanas (corrupção e desigualdade). Mas mostra que a mistura explosiva de militarismo, autoritarismo e narcisismo do presidente Chávez o levou a ter o governo mais excludente e corrupto da história moderna da Venezuela. Antes de tachar a oposição venezuelana de representante das elites corruptas e antidemocráticas que tentaram dar o golpe de Estado injustificável de 2002, teria sido aconselhável questionar o motivo da criação da maior, mais ativa e diversificada coalizão de grupos e forças da história da Venezuela. Esse enorme movimento social, que também inclui dois em cada três venezuelanos pobres, possui um único elemento comum: o desejo de afastar Chávez do poder. A luta de classes, os pobres contra os ricos, o racismo, a oligarquia protegendo seus interesses próprios, a influência da CIA e outras explicações tão comodamente usadas pelos observadores externos (e explorados por Chávez com grande inteligência) não servem para explicar o que acontece na Venezuela. Não explicam por que Chávez, que tinha mais de 90% de apoio popular, passou a ter menos de 30%. Não explicam por que seus aliados mais próximos se transformaram em seus opositores mais radicais. Nem por que os meios de comunicação, os jornalistas e os intelectuais que o ajudaram a chegar ao poder agora se opõem furiosamente a ele. A oposição venezuelana não é um movimento político tradicional. É uma mobilização social formada por uma rede de redes que não se reportam a nenhum organismo central, incluindo grupos autônomos de bairros, sindicatos, escolas, agrupações regionais e simples cidadãos que nunca antes tinham participado de política. Não tem líder ou mensagem para a era pós-Chávez. Nem respostas para os problemas do país nem uma estratégia de comunicação inteligente. Também inclui pessoas e grupos com tendências antidemocráticas, assim como políticos oportunistas do passado. Mas isso não é novidade. O que é novo e que o mundo só agora começa a descobrir é que uma imensa maioria de venezuelanos está disposta a imolar-se para defender seu país do que vê como sendo uma ameaça inaceitável. Isso gera paixão imensa, que transborda nas ruas quase diariamente, apesar de os Círculos Bolivarianos, organizados por Chávez e treinados por cubanos, atacarem os manifestantes e às vezes os assassinarem impunemente. Essa energia das ruas, pouco organizada e sem líder, mas determinada, encerra uma lição que o presidente Lula faria bem em não ignorar. Moisés Naím, venezuelano, é editor da revista "Foreign Policy", em Washington. Foi ministro da Indústria e Comércio da Venezuela. Tradução de Clara Allain Texto Anterior: Frases Próximo Texto: Jacob Pinheiro Goldberg: FHC e Lula: culturas em colisão Índice |
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