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São Paulo, sábado, 29 de março de 2003

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TENDÊNCIAS/DEBATES

O subsídio ao primeiro emprego é uma boa medida?

SIM

Juventude como solução

MARCIO POCHMANN

Gerações de brasileiros ao longo do século passado questionaram o fato de o país ter sido o último do mundo a abolir a escravidão, somente ao final do século 19. Apesar de dispor de condições técnicas suficientes para aprofundar a estrutura produtiva e ocupacional no trabalho livre, o país insistiu, por razões de ordem política, em permanecer mais tempo sustentado por modelo social ultrapassado.
Da mesma forma, atualmente, novas gerações de brasileiros se perguntam como é possível uma sociedade continuar a conviver com parcela crescente de seus jovens marginalizada. Sabe-se que a cada dois desempregados existentes no país, um possui menos de 25 anos de idade, o que tem impulsionado a emigração de talentos para outros países, como aconteceu na década de 1990, quando cerca de 1,3 milhão de jovens abandonaram o Brasil.
Não sem motivo, somente 1 de cada 10 jovens que ingressam no ensino básico consegue completar a universidade, o que se reflete, muitas vezes, no maior flanco para a manifestação da violência, que atinge hoje patamar superior ao de vários países em conflito aberto.
Tudo isso tem contribuído para que, geralmente, a juventude seja identificada como problema. Equívoco lamentável, posto que a juventude de um país representa o que há de elevada positividade na solução de desafios existentes.
Desde a Constituição de 1988, o Brasil avançou consideravelmente nas dificuldades associadas às crianças e aos adolescentes. O mesmo, contudo, não se observa em relação à juventude, pois há um verdadeiro vazio nas políticas públicas para o segmento das pessoas de 16 a 29 anos de idade, conceito etário mais adequado para definir a fase juvenil.
O que existe, na maioria das vezes, é limitado, quando não equivocado tecnicamente, pois grande parte das políticas para o jovem tende a condenar o filho do pobre a ter de ingressar precocemente no mercado de trabalho. Isso está na contramão do que acontece com os filhos dos ricos, que entram no mercado de trabalho mais tarde, geralmente após completarem pelo menos a universidade, ocupando, nas empresas, as vagas superiores, com maiores remunerações, o que reproduz, por consequência, a desigualdade de renda.
Três devem ser os eixos estruturantes de uma ação pública para a juventude brasileira. Inicialmente, a existência de uma política econômica comprometida com a sustentação de um rápido crescimento da produção e da ocupação. Simultaneamente, a definição de uma política redistributiva, capaz de garantir o acesso a uma bolsa-renda direcionada à elevação da escolaridade até o ensino médio, acompanhado do exercício de atividades comunitárias de pertencimento e protagonismo social para jovens com menos de 21 anos de idade oriundos de famílias pobres. E, ainda, a generalização de amplas oportunidades de ocupação especificamente para jovens com escolaridade a partir do ensino médio.
Os eixos estruturantes de uma política séria e adequada à juventude já existem. No município de São Paulo, por exemplo, o segmento pauperizado da população com até 20 anos de idade dispõe de bolsas de garantia de renda vinculadas à elevação da escolaridade (programas como Renda Mínima e Bolsa-Trabalho atendem 465 mil crianças e jovens no ensino básico ou médio).
Ainda no âmbito da educação, a Prefeitura de São Paulo faculta aos jovens carentes de 16 a 29 anos de idade com ensino médio completo o acesso a uma rede de curso pré-vestibular gratuito, visando favorecer o acesso às principais universidades, que contam com subsídio fiscal municipal para dar bolsas aos estudantes pobres.
Em relação à inserção do jovem no mercado de trabalho, duas são as alternativas públicas disponíveis no município de São Paulo. De um lado, aos jovens que se encontram no ensino médio ou superior, a prefeitura disponibiliza uma linha de estágios no setor produtivo como meio de permitir a formação ocupacional no próprio local de trabalho, através de financiamento de parte dos custos operacionais das empresas. De outro lado, para os jovens que concluíram o ensino médio ou superior, a prefeitura financia o custo da qualificação e da experiência profissional no próprio local de trabalho, para as empresas que contratem com carteira assinada.
Em suma, o Brasil possui uma juventude que continua a ser uma solução. Precisa, todavia, de uma efetiva e universal política pública inteligente, que termine por revelar a concepção de uma sociedade que enfrente seus principais desafios.


Marcio Pochmann, 40, economista, professor licenciado do Instituto de Economia da Unicamp, é secretário do Desenvolvimento, Trabalho e Solidariedade da Prefeitura de São Paulo.


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