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São Paulo, sábado, 29 de março de 2003

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TENDÊNCIAS/DEBATES

O subsídio ao primeiro emprego é uma boa medida?

NÃO

Primeiro emprego e primeiro namoro

HÉLIO ZYLBERSTAJN

Em todos os países, a taxa de desemprego dos jovens é maior do que a dos demais grupos etários. A explicação usual é que os jovens teriam dificuldade de arranjar emprego, principalmente o primeiro emprego. As empresas prefeririam contratar trabalhadores "com experiência".
O remédio sugerido é subsidiar o primeiro emprego. Pagar para as empresas contratarem trabalhadores inexperientes. Mas as políticas de subsídio custam muito caro e em geral fracassam. Ou não reduzem o desemprego entre os jovens, ou deslocam o desemprego destes para outros grupos, pois as empresas substituem os trabalhadores que normalmente contratariam por jovens, para ganhar o subsídio do governo.
No Brasil, uma política de subsídio ao primeiro emprego seria um duplo engano. Primeiro, devido à probabilidade de fracasso, que é grande. Segundo, por ser um desperdício de recursos num momento de severa restrição fiscal. O que fazer? Por que o diagnóstico que leva ao subsídio está errado?
Na verdade, os jovens não têm dificuldade de arranjar emprego. Ou, pelo menos, a dificuldade dos jovens não é maior que a dos trabalhadores mais velhos. Há, sim, empregos para os jovens. Ocorre que os jovens têm dificuldade em permanecer muito tempo nos primeiros empregos. Para entender por quê, basta comparar a procura de emprego à busca do casamento. Em geral, os jovens não se casam com o primeiro namorado. Eles não têm dificuldades para encontrar um namorado, mas seus primeiros romances são curtos.
Com o passar do tempo, os jovens ficam experientes, encontram alguém e formam, então, um par mais permanente. A proporção de "avulsos" entre os jovens é mais alta do que entre os mais velhos não porque os jovens não namoram, mas porque seus namoros são curtos. Há sempre muitos jovens "procurando" namorados. E é bom que seja assim, pois a rotatividade nos romances da juventude acaba produzindo melhores encontros definitivos.
Com o emprego é a mesma coisa. Os jovens "rodam" mais porque experimentam as empresas e são experimentados por elas. Isso é bom. Com o tempo, encontram uma vaga e criam um vínculo mais duradouro.
Esse diagnóstico alternativo explica por que a política de subsidiar o primeiro emprego seria um erro. Ela induziria "casamentos" precoces e ineficientes. Seria um desperdício, porque os casamentos não durariam. Para reduzir o desemprego dos jovens, seria melhor ajudar o mercado a fazer a rotatividade necessária entre eles, mas com menor tempo de procura de emprego e com menores custos para as empresas.
Como? Uma possível solução é um consórcio de empregadores de jovens, uma pessoa jurídica formada voluntariamente por um grupo de empresas. Uma empresa do consórcio contrataria um jovem formalmente. Se não desse certo, ele seria liberado para procurar outra empresa do mesmo consórcio. Demoraria menos para encontrar uma nova vaga, pois o jovem se candidataria automaticamente a todas as vagas oferecidas no consórcio. O vínculo de emprego seria com o consórcio, não com as empresas. A troca de emprego dentro do mesmo consórcio não seria um desligamento.
Enquanto o jovem estivesse "rodando" entre as empresas do consórcio, nenhuma delas teria que pagar o aviso prévio nem a multa do FGTS. Depois de um certo tempo, se o jovem não tivesse encontrado o "casamento" definitivo, seria finalmente desligado, com o pagamento de todos os direitos, rateados entre as empresas que tivessem utilizado seu trabalho. Se, por outro lado, o jovem se fixasse em alguma das empresas, esta o efetivaria e ele sairia do consórcio.
O consórcio reduziria o custo de contratar jovens porque o pagamento das verbas rescisórias ocorreria apenas uma vez e seria rateado. Para os jovens, os custos e o tempo de procura de emprego a cada desligamento seriam grandemente reduzidos. Mas a maior vantagem é que o governo não gastaria nada. Seria um programa de grande alcance social, sem custos para os contribuintes, pois utilizaria recursos existentes. As empresas se organizariam voluntariamente em cobrindo regiões ou bairros das grandes cidades. Seriam cadastrados nas agências públicas existentes (Sine, Centros de Solidariedade, Centrais de Emprego e Renda etc.). Os jovens à procura de emprego também se cadastrariam nessas agências, formando pools de trabalhadores disponíveis na região.
Num momento em que as empresas demonstram que estão dispostas a assumir sua responsabilidade social, não seria difícil mobilizá-las para ajudar os jovens a se tornarem mais experientes no mercado de trabalho. Principalmente porque, ao ajudá-los, as empresas estariam também se ajudando, reduzindo os custos de encontrar os jovens que melhor se adaptam às suas vagas.
O primeiro emprego é parecido com o primeiro namoro: todos querem experimentar, mas é difícil saber com quem. Em vez de pagar por algo que as pessoas vão acabar fazendo, não seria melhor simplesmente ajudá-las a encontrar o melhor parceiro?


Hélio Zylberstajn, 57, professor da Faculdade de Economia e Administração da USP, é pesquisador da Fipe, onde coordena o Programa Mediar - Informações para a Mediação Estratégica entre Trabalho e Capital.


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