São Paulo, quarta-feira, 29 de junho de 2005

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ANTONIO DELFIM NETTO

Caos político x ordem econômica

Estamos vivendo um momento preocupante, em que paixões desatinadas podem comprometer mais uma vez o futuro do Brasil. Dos países "esperanças do século 21" (os BRICs: Brasil, Rússia, Índia e China), somos o único que já acertou as suas contas com o passado e no qual as diferenças étnicas, religiosas e de linguagem não têm nenhum papel histórico. Nada, portanto, pode impedir o nosso pleno desenvolvimento a não ser a paixão política que pretende que estejamos no "caos político". Perplexo diante dos fatos recentes, o próprio presidente quer ver esclarecidas todas as dúvidas "cortando na própria carne" se for preciso. Isso não deve nos intimidar, pois as instituições darão conta do recado e se fortalecerão, como aconteceu no passado recente.
Essa espécie de catarse aristotélica a que estamos assistindo não levará ao caos, mas à sua própria superação com a purgação dos agentes e da sociedade. O resultado final será um aperfeiçoamento do corpo político. Este estará cada vez mais próximo de ajustar-se às necessidades de uma república democrática com os múltiplos objetivos de garantir a plena liberdade individual num quadro de justiça, de relativa igualdade e de razoável eficiência econômica.
O que não podemos e não devemos é perder o passo da história, confundindo eventuais problemas de corrupção com os problemas econômicos. Estes devem resolver-se no universo da política econômica, uma sutil combinação de "ciência" e arte que certamente depende do universo político. As CPIs, o Ministério Público, a Polícia Federal e, no fim, o Poder Judiciário deverão providenciar a feitura da "justiça", e não a promoção da "vingança".
Isso deve manter ocupado um pequeno segmento do Congresso (certamente menos de 10% de seus membros) nas CPIs. O grosso dos congressistas, sobre os quais não pesa nenhuma dúvida, pode e deve manter o ritmo legislativo atento às eventuais conclusões das CPIs. Estas devem concentrar-se nas propostas de aperfeiçoamento do sistema. A "justiça" individual será feita na esfera da Polícia Federal, do Ministério Público e do Poder Judiciário.
Esta nos parece ser a hora ideal para uma ação conjunta do governo, das oposições e da sociedade civil capaz de formular um novo programa econômico, sério, realista e profundo, para desenrolar-se durante muitos anos. É preciso eliminar, de uma vez por todas, os condicionantes construídos na Constituição de 1988 (e agravadas posteriormente) para limitar a ação do Poder Executivo no campo dos gastos governamentais. Os últimos 17 anos foram de patinação e sacrifícios, com resultados pífios: controlamos a inflação à custa de espoliar o setor privado, elevando o endividamento estatal e a carga tributária bruta a limites até então impensáveis, o que reduziu o crescimento à ridícula média de 2,3% ao ano! Estamos hoje numa armadilha em que a política monetária transformou o real na moeda mais valorizada do mundo. É hora de libertá-la para que possa exercer o seu papel como em outros países, cuidando da estabilidade da moeda sem pôr em risco o desenvolvimento. Só a política fiscal pode fazer isso!


Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras nesta coluna.
@ - dep.delfimnetto@camara.gov.br


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