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CLÓVIS ROSSI
A última virgem
SÃO PAULO - A anestesia de boa parte do público, estimulada por um setor do jornalismo, faz com que a
aberração passe por normalidade no
jogo eleitoral em andamento.
A mais recente aberração, engolida
como se fosse a coisa mais natural do
mundo, é o abraço entre Luiz Inácio
Lula da Silva, o candidato do PT, e o
ex-presidente José Sarney.
Nada contra alianças, é bom esclarecer de saída. Mas tudo contra
alianças que não incluam um "erramos" a respeito do comportamento
das partes no passado.
Nesse caso, ou José Sarney faz uma
autocrítica e diz que o PT tinha toda
a razão em esculhambá-lo como fez
durante os seus cinco anos de governo, ou o PT é que vem a público para
dizer que Sarney foi um presidente ao
menos razoável.
Sem esse "erramos" de uma parte,
de outra ou de ambas, a aliança de
agora equivale a vender a alma para
ganhar a eleição -para usar expressão de Ciro Gomes (ele próprio sem
autoridade moral para utilizá-la depois de juntar no mesmo saco fisiológicos, ressentidos e alguns ideológicos, como se todos fossem de fato
"trabalhistas" desde o berço).
Não me venha o leitor petista com o
argumento de que todos fazem esse
tipo de aliança esdrúxula. É verdade,
mas é, para os outros, verdade antiga. Aos olhos do PT, venderam a alma antes (no discutível pressuposto
de que de fato a tivessem).
O PT, ao contrário, pretendia-se a
virgem no bordel que dizia ser a política tupiniquim. Agora, até chama os
fotógrafos para testemunhar um defloramento após o outro.
Repito: nada contra alianças. Mas
o eleitor tem o direito de saber por
que Sarney de repente virou cidadão
de bem aos olhos do PT, que antes o
acusava até de "grilagem" de terras.
Política não pode ser feita, eternamente, ao ritmo de esqueçam o que
eu escrevi, esqueçam o que eu disse,
esqueçam quem eu fui.
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