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FERNANDO DE BARROS E SILVA
Dona Jura contra
o neocirismo
Parece que o milk Scheinkman de
Ciro Gomes desandou no bar de
Dona Jura. Tudo indica que teremos
um setembro muito mais animado do
que faziam supor os coveiros de véspera da candidatura tucana.
Derreteram em uma noite, após
uma semana de campanha na TV,
previsões repetidas à exaustão sobre o
placar do primeiro turno. A subida de
Serra e a queda de Ciro destroem, até
segunda ordem, as expectativas de
que o candidato do governo iria desempenhar papel de figurante de luxo.
A receita de Nizan Guanaes até aqui
se revelou eficaz: bombardeou Ciro,
por um lado, e entupiu o horário tucano de artistas populares, por outro.
Nos dois casos, sem muito pudor, como manda o marketing político pressionado pelo desespero. De Guanaes,
que já comparou o PT ao Taleban e
anunciou que iria invadir Cabul no
auge da cruzada norte-americana, pode-se, aliás, esperar qualquer tipo de
arte. A campanha de Ciro, anestesiada
numa espécie de transe pelo êxito súbito, deve finalmente reagir nos termos do adversário.
Salta à vista, de qualquer modo, o
contraste entre uma campanha detalhadamente maquinada por uma brigada de profissionais do ramo -a de
Serra- e o mambembismo da outra,
refém em demasia do brilho performático do próprio candidato.
O que se viu da Frente Trabalhista
na TV até agora, aliás, traduz mais
uma vez o voluntarismo dessa candidatura, cujo programa de governo, na
verdade uma "work in progress" só
disponível na internet, está a cargo de
um brilhante professor, desde já candidato ao título de Enéas de Harvard.
Numa campanha em que Roseana
Sarney foi do céu ao inferno e na qual
o próprio Serra já viveu a sua ascensão
e queda para agora ressuscitar, é bom
ter cautela com as palavras. Coisa que
faltou a Ciro na semana passada,
quando disse já estar "sentindo o cheirinho gostoso da vitória".
Abraçado ao PL, ao quercismo e ao
patriarca da oligarquia maranhense,
Lula, bem embalado pelo sentimentalismo de resultados de Duda Mendonça, tende a se beneficiar agora da guerra dos outros. Tudo o que o PT não
quer, porém, é enfrentar Serra depois.
A mudança de expectativas no cenário eleitoral apanhou o cirismo num
momento de troca de casca. Nas últimas semanas, a mesma imprensa que
enterrou Serra com certo atropelo registrou corretamente o namoro de setores do empresariado e do pensamento econômico liberal (ambos ligados por afinidades várias a FHC) com
a candidatura do PPS. Excetuando-se
as suas frequentes recaídas, Ciro vinha
fazendo um esforço coordenado para
se tornar mais palatável aos donos do
banquete.
Não é outro o sentido do convite a
José Alexandre Scheinkman, menos
útil pelas idéias que porventura tenha
para consertar o país e muito mais pelo verniz de confiabilidade que possa
emprestar a uma candidatura que
funciona à base do radicalismo verbal,
como uma espécie de ventoinha soprando ora à esquerda, ora à direita.
No momento em que parecia começar a se distanciar da ficção do trabalhismo para tentar amarrar com o
amigo Tasso uma coalizão de poder
de carne e osso, Ciro foi golpeado pela
subida de Serra. Resta esperar para ver
quantas aves do neocirismo vão bater
asas na direção do ninho tucano.
Fernando de Barros e Silva é editor de Brasil.
Hoje, excepcionalmente, não é publicado o artigo
de Otavio Frias Filho, que escreve às quintas-feiras nesta coluna.
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