São Paulo, terça-feira, 29 de setembro de 2009

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CARLOS HEITOR CONY

A embaixada e a calçada

RIO DE JANEIRO - Até que ponto o Brasil, em nome da democracia, se meteu num problema interno de país soberano como Honduras? Há reclamações gerais e merecidas quando os Estados Unidos, em nome da mesma democracia, invadem países soberanos como o Iraque. O fim justifica o meio?
Bem verdade que o Brasil não pensa em invadir nenhum país, limitou-se a dar asilo em sua embaixada a um político local que havia sido derrubado da Presidência por um golpe de Estado. Até aí, tudo bem. Acontece que, além do asilo, o Brasil pretende reinstalar Zelaya no poder, e isso pode parecer aos hondurenhos uma intromissão na soberania daquela nação.
A embaixada brasileira em Tegucigalpa é território do Brasil, mas a calçada em que fica a embaixada é hondurenha, a menos que o Brasil decida ir à guerra para colocar Zelaya no poder. Que houve golpe de Estado em Honduras, houve. É motivo bastante para outro país querer consertar as coisas?
Zelaya é acusado de tentar violentar a normalidade democrática, criando um conflito interno que os hondurenhos resolveram de forma golpista -mas daí a justificar a intromissão de estrangeiros em sua política interna vai uma distância. A condição de asilado que Zelaya desfruta na embaixada brasileira é prejudicada pela pregação do ex-presidente, que continua sua luta para recuperar o mandato que lhe foi realmente roubado.
A primeira obrigação de um asilado é manter um silêncio obsequioso em relação ao país que o abriga, deixando que a situação interna se resolva soberanamente, com seus partidários indo à luta para a volta da normalidade democrática. Tivemos no Brasil a experiência dos exilados que passaram anos à espera de que, aqui dentro, a sociedade brasileira decidisse pelo retorno da democracia.


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