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São Paulo, quinta-feira, 30 de janeiro de 2003

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DOGMAS RENITENTES

Divulgada ontem, a ata da reunião da semana passada em que o Banco Central (BC) decidiu aumentar novamente os juros explicita alguns dos impasses que a política econômica ainda enfrenta.
A reunião foi a primeira após o anúncio do novo objetivo da política monetária para 2003: limitar a alta do IPCA (o índice de preços que serve de parâmetro para as metas de inflação) a 8,5%. O objetivo prévio do BC -que consistia em manter a inflação abaixo de 6,5%- era, para muitos analistas, muito pouco factível. Por isso a revisão foi recebida como sinal de maior realismo do BC.
Mas as justificativas apresentadas para a decisão, subsequente, de aumentar a taxa de juros básica revelam os limites do aumento do realismo. Alguns dogmas do governo anterior continuam muito influentes no desenho da política econômica.
Em particular, subsiste o dogma de que manejar a taxa de juros é suficiente para cumprir as metas de inflação. As experiências de 2001 e 2002 -anos em que a meta de inflação foi descumprida, por larga margem, devido à falta de energia elétrica e à forte alta do dólar- não bastaram para convencer as autoridades das limitações dessa abordagem.
Na prática, os dois pilares da política macroeconômica continuam a guardar a relação de hierarquia presente há anos: a política monetária prepondera sobre a fiscal. Os juros altos, que visam objetivos ambiciosos no combate à inflação, mantêm a dívida pública pressionada; a política fiscal se vê premida, para frear a expansão da dívida, a aumentar impostos, cortar gastos e elevar a meta de superávit fiscal.
Essa peculiar articulação entre as políticas monetária e fiscal produz uma hierarquização dos objetivos macroeconômicos: a ênfase antiinflacionária prepondera sobre o estímulo ao crescimento. Não é por acaso que o peso do investimento no PIB foi em 2002, segundo o Ipea, o mais baixo dos últimos dez anos; que o volume de crédito concedido pelos bancos caiu de 37% do PIB para 24% do PIB entre 1995 e 2002; e que o desemprego se situa em nível recorde.
As eleições evidenciaram que o respaldo popular a essa política econômica se desgastou. Mas ainda se aguarda um redesenho mais coerente da estratégia econômica. Cabe articular os instrumentos de política econômica de modo mais equilibrado, para que a estabilidade de preços e o crescimento deixem de ser objetivos concorrentes e, em grande medida, recorrentemente frustrados.


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