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São Paulo, quarta-feira, 30 de abril de 2003

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CLÓVIS ROSSI

Qual é o século?

BUENOS AIRES - Diz o secretário-geral da Presidência, Luiz Dulci: "Evidentemente, nós não podemos dar respostas do século 19 a problemas do século 21. A esquerda também evolui". É, como se sabe, uma crítica aos mal chamados radicais do PT, que se opõem a pontos importantes das reformas defendidas pelo governo e a aspectos ainda mais importantes da política econômica.
Aceitemos a frase apenas para poder contra-argumentar. A partir dela, a pergunta seguinte só pode ser: a que século pertencem as reformas e a política econômica?
Com alguma condescendência, pode-se responder que pertencem ao século passado. Haverá alguns que até recuarão mais no tempo para dizer que as novas políticas reproduzem Maria Antonieta (século 18, portanto): para ela, quem não tinha pão deveria comer brioche. Agora, quem não tem emprego que coma "sopão", e estamos conversados.
Mas enveredar por aí seria birra. O fato concreto e indisputável é que, no mínimo, o PT pratica uma política do século passado, já testada (e desaprovada) em incontáveis países da América Latina e do mundo. E um de seus principais ideólogos, não obstante, vem reclamar "respostas do século 21".
Suspeito até de que Luiz Inácio Lula da Silva tenha sido eleito com a expectativa de que, ele sim, inventaria soluções do século 21.
Até agora, apenas reinventou o mofino discurso das reformas, que já viraram uma espécie de muleta retórica. Em qualquer análise de gente do governo (deste e do anterior, aliás) e dos inefáveis analistas de mercado, a palavra reforma surge como o "abre-te Sésamo", a pomada maravilha que curará todos os males, de pé-de-atleta a Aids.
Nada contra as reformas. Tudo contra desonestidade argumentativa. Antes de criticar quem critica certas coisas do governo, governistas como Dulci deveriam reconhecer que, eleitos, voltaram ao século passado e passaram a enxergar méritos no que antes fulminavam liminarmente.


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