São Paulo, quinta, 30 de abril de 1998

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Culpa coletiva

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Pesquisa divulgada esta semana revelou que a violência é hoje a maior preocupação do Rio de Janeiro em todas as classes sociais e faixas etárias. Praticamente, de forma violenta morre um habitante desta cidade a cada hora. Em São Paulo, pelo que leio nas folhas, a situação, se não igual, é equivalente.
Fica fácil botar a culpa nos atuais governantes, e eles são culpados de fato, sobretudo o presidente da República, que incluiu o problema entre as cinco prioridades de seu governo. Mas há uma culpa coletiva em todas as tragédias sociais.
Discute-se até hoje o caso do nazismo e são muitos -e categorizados- aqueles que admitem a culpa coletiva do povo alemão na maior tragédia do século. Os horrores do Terceiro Reich podem ser personalizados em bestas humanas com cara e nome, mas houve uma tolerância, senão uma geral e velada cumplicidade em tudo aquilo.
Pode não parecer, mas, no que diz respeito à violência urbana que sofremos, há também uma complacência generalizada diante de suas causas. Cito apenas duas, as mais visíveis: o desemprego e a droga.
Na questão do desemprego, firmas grandes, médias e pequenas lamentam a crise, mas se desapertam à primeira dificuldade com a demissão às vezes em massa de seus empregados. É o caminho mais cômodo e menos criativo para enfrentar uma crise de caixa ou de produção. Em muitos casos, a demissão é apenas uma esperteza para abrir espaço ao mercado informal de trabalho.
Com a droga, a sociedade condena radicalmente o traficante, mas ainda não encontrou uma solução para o caso do dependente. Enquanto houver dependente, haverá traficante e crime.
Evidente que traficante e dependente terão de ser encarados de forma diferenciada. Mas tolerar ou até mesmo bajular o dependente é uma forma de manter o núcleo sobre o qual se arma a estrutura do crime organizado.



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