São Paulo, quinta-feira, 30 de agosto de 2007

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Democracia no islã

DEMOCRACIA e islamismo são compatíveis? A Turquia tenta demonstrar que sim, mas enfrenta um duro teste com a assunção do ex-chanceler Abdullah Gül à Presidência. Gül é um muçulmano moderado, mas, na Turquia, qualquer inclinação religiosa basta para despertar a desconfiança do establishment laico, formado por oficiais do Exército e por altos funcionários públicos.
Em abril, terminou frustrada a primeira tentativa do premiê Recep Erdogan de emplacar Gül -no sistema turco, o primeiro-ministro tem a prerrogativa de indicar o presidente ao Parlamento. As Forças Armadas ameaçaram com um golpe para preservar a laicidade do Estado.
Diante do impasse, Erdogan antecipou as eleições legislativas para julho, e o partido moderado islâmico AK, ao qual ambos pertencem, obteve uma vitória convincente: 47% dos votos -contra 34% no pleito de 2002. Municiado pelas urnas, Erdogan voltou a apresentar a candidatura de Gül e, desta vez, ele foi eleito.
Os militares não gostaram, mas preferiram não reagir. Uma aventura extra-institucional poderia comprometer de vez as chances de o país integrar a UE.
As diferenças entre laicos e religiosos remontam à fundação da Turquia moderna. Entre as primeiras medidas baixadas por Mustafá Ataturk (1881-1938), nos anos 20 e 30, estão a proibição do uso do "hijab", o véu islâmico, em instituições públicas.
O AK, o equivalente islâmico das democracias cristãs européias, tem evitado o confronto. Não tentou, por exemplo, reverter a lei do véu. O maior desafio que lançou foi a indicação de Gül.
Espera-se que os dois lados consigam entender-se. Para a Turquia consolidar-se como primeira democracia plena do mundo islâmico, é preciso que o Estado permaneça laico, mesmo sob um partido islâmico -e sem a tutela dos militares.


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