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ROBERTO MANGABEIRA UNGER
ParadoO Brasil, caldeirão de energia
frustrada, está parado. A retração
dos investimentos, a persistência do
desemprego e as perdas salariais acumuladas perpetuam mais de duas décadas de estagnação econômica.
Agravada agora por desesperança. O
alívio dos endinheirados e dos doutos
em constatar que o governo do PT não
seria perigoso por conta de suas ousadias foi seguido pela descoberta de
que ele é perigoso por causa de seu
conformismo e de sua falta de imaginação.
A inflexão depressiva resultante dessa descoberta é o mais temível dos males que nos cercam. Por isso é preciso
confrontá-la com algumas realidades.
Temos base para ciclo de crescimento
de grande vigor e amplidão. Ponta
agrícola e mineradora comparável às
melhores do mundo é complementada por empresas, em quase todos os
setores da indústria, que renovaram,
sob a disciplina da estagnação, seus
métodos de trabalho. Por trás desse
avanço de paradigma produtivo ocorre outro processo ainda mais importante: a difusão de nova cultura de auto-ajuda e iniciativa entre milhões de
profissionais e empreendedores
emergentes, destituídos, porém, de
meios e de oportunidades.
O que falta? Enfrentar o impasse das
finanças públicas -se necessário, por
renegociação das dívidas interna e externa- para assegurar que o juro fique abaixo da taxa média de retorno
dos negócios e para evitar que o dinheiro público vá para os rentistas em
vez de ser investido em gente e em
condições de produção. Desenvolver
práticas que permitam ao Estado ajudar os produtores a ganhar acesso a
crédito, a comercialização, a tecnologia e a conhecimento sem ver a ajuda
pública capturada por apaniguados e
falastrões. Colocar dinheiro no bolso
do trabalhador para que ele possa
comprar o que se produz. E dar salto
de qualidade no ensino público, oferecendo estímulos especiais aos alunos
pobres mais talentosos e aplicados.
O governo atual teria duas maneiras
principais de dar o primeiro passo
nessa direção. Uma, direta, seria reconhecer que o dinamismo produtivo
não virá sem que se enfrentem, por
meio da renegociação das dívidas, os
parceiros da estagnação. A outra, indireta, seria desprivatizar o Estado, desmontando acertos fisiológicos entre
empresários e políticos. Ainda que lhe
faltem dinheiro e ensino, o país começaria a levantar-se com suas próprias
mãos se não lhe faltasse também o
cumprimento das leis.
A primeira solução romperia com o
culto da confiança financeira (de que
o Brasil, entre os países periféricos
grandes, é o último bastião); a segunda sanearia o financiamento eleitoral e
recuperaria, por meio de gestão profissional independente, os fundos de
pensão, usados abusivamente pelo
governo do PT, como foram pelo governo anterior, para fazer e desfazer
grandes negócios. Ambas as soluções
são improváveis porque exigem reviravolta de idéias e de atitudes. É mais
fácil esperar que a recuperação das
economias centrais nos devolva a
crescimento medíocre e efêmero.
Para os inconformados sobra a solução que sempre foi a melhor: começar
tudo de novo, construindo nova força
capaz de representar a alternativa desenvolvimentista e democratizante
que o país continua a querer. Perseverança, imensa e quase absurda, motivada por amor, é o de que precisamos.
É pedir muito. Mas pedir apenas o que
se tornou necessário.
Roberto Mangabeira Unger escreve às terças-feiras nesta coluna.
www.law.harvard.edu/unger
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