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São Paulo, sexta-feira, 31 de janeiro de 2003

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ELIANE CANTANHÊDE

Empurrando com a barriga

BRASÍLIA - Enquanto um manifesto de oito líderes europeus circulava no mundo com apoio à guerra de George W. Bush contra Saddam Hussein, Lula reunia no Planalto ministros, governadores, prefeitos e parlamentares para anunciar o Fome Zero: "Nossa guerra não é para matar ninguém - é para salvar vidas".
O manifesto foi de Espanha, Portugal, Reino Unido, Itália, Hungria, Dinamarca, Polônia e República Tcheca. França e Alemanha ficaram fora. É entre esses dois pólos que o Brasil (leia-se governo Lula) vai ter que optar. Não há política externa criativa que possa driblar a polaridade.
Dentro do país, Lula mobiliza corações e mentes para o Fome Zero, que definiu como uma combinação entre "o emergencial e o estrutural". Ou, como dizia já na campanha, "é preciso dar o peixe e ensinar a pescar". Mas o programa é também para marcar diferenças com "governos anteriores", o que se tornou flagrantemente inviável na economia.
Fora do país, Lula tem usado uma técnica semelhante. Nem apóia nem desaprova a guerra de Bush, nem fica escancaradamente com França e Alemanha nem com os oito de ontem. Ou seja, está ganhando tempo.
É uma boa tática e, como o Fome Zero, pode render resultados políticos. Por enquanto, o Brasil de Lula mantém o discurso do Brasil de FHC: respeita-se a decisão do Conselho de Segurança da ONU -que os EUA ignoraram na guerra do Kosovo. Mais cedo ou mais tarde, Lula vai ter que se manifestar mais "afirmativamente" ou "pró-ativamente", como se propõe sua política externa.
Vê-se, portanto, que o novo governo explora bem a lua-de-mel. Investe na grande causa do combate à fome e não arrisca declarações apressadas sobre a guerra contra o Iraque.
Por enquanto, tudo bem. E depois? Quando o Fome Zero não for mais novidade e a população cobrar empregos? Quando Bush jogar suas bombas e o mundo cobrar posições claras e definidas de quem se pretende líder? Hoje, o amor é lindo. Mas isso não dura para sempre.


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