|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
TENDÊNCIAS/DEBATES
Para reverter o pessimismo
EMERSON KAPAZ
Há seis meses, se alguém dissesse
que o Brasil seria pentacampeão
mundial de futebol, seria alvo de risos e
chacotas. Um time que não conseguia
sequer marcar gol de pênalti era percebido como mais uma desgraça nacional.
A seleção não se deixou contaminar por
esse pessimismo atávico da brasilidade,
chegou à final da Copa e conquistou a
taça.
Na economia, ocorre algo semelhante.
É certo que atravessamos tempos difíceis. Investidores externos, tradicionalmente avessos a riscos, já estão cautelosos até em relação aos Estados Unidos.
Ficou mais do que claro: às vésperas de
uma eleição presidencial e com a forte
perspectiva de vitória de um candidato
da oposição, o Brasil precisará caminhar pelas próprias pernas durante um
bom tempo.
Deixar-se abater pelo pessimismo, entretanto, é desprezar o grande potencial
que o país possui -e não é só no futebol- para se reestruturar e retomar o
crescimento. Por isso, em vez de ficar
chorando pelos cantos e se deixar pisotear pelos estouros de manada do mercado financeiro, as elites responsáveis
deveriam, desde já, começar a discutir
uma agenda econômica, com propostas
consistentes.
Uma dessas proposições, apresentada
pelo candidato da Frente Trabalhista,
Ciro Gomes, almeja um alongamento
articulado e negociado de uma parte da
dívida interna. Por mais que seus detratores tentem colar a imagem de calote
na proposta, na verdade não se trata de
uma imposição. Quer-se que investidores e poupadores se sintam estimulados
a continuar apostando no Brasil. Foi
exatamente isso que fez o presidente do
Banco Central, Armínio Fraga, ao alongar o perfil da dívida interna brasileira
para 30 meses. Obrigar investidores e
poupadores a fazerem algo com que
não estivessem de acordo seria uma celeridade.
Este, entretanto, é o lado financeiro da
questão. O problema de fundo, que
consiste na retomada da confiança para
possibilitar o crescimento, só terá solução possível a partir do momento em
que houver um quadro favorável a uma
redução substancial dos juros básicos
da economia. Para isso, as reformas tributária e previdenciária são pré-condições estratégicas.
Com a forte perspectiva de vitória de um candidato da oposição, o Brasil precisará caminhar pelas próprias pernas
|
A tributária é fundamental para desonerar a indústria e elevar o poder aquisitivo dos salários, proporcionando escala e competitividade que ajudarão na
substituição das importações e no crescimento consistente dos saldos positivos na balança comercial.
A previdenciária é imperiosa para
construir um sistema auto-sustentável
de seguridade social, que concomitantemente invista um grande volume de
poupança em projetos produtivos de
longo prazo.
Olhando para o empresário, além de
uma política industrial formatada dentro de um projeto nacional de desenvolvimento, é preciso criar um banco de fomento que atenda e financie a pequena
e a média empresa. Isso pode ser obtido
com parte dos recursos do BNDES e a
utilização da estrutura do Sebrae. Em
vez de financiar projetos a partir de um
piso, a nova agência de desenvolvimento daria créditos para projetos até um
teto de R$ 8 milhões, por exemplo.
Na área do comércio exterior, é necessário criar um regime especial para empresas exclusivamente exportadoras,
que teriam um CNPJ somente para exportar, podendo adquirir matérias-primas, máquinas e equipamentos sem
impostos no Brasil. Estudos sobre essa
proposta, que estavam sendo realizados
no Ministério da Fazenda, foram suspensos há um ano.
Essas são apenas algumas das ações
factíveis de um grande elenco de medidas necessárias para a recriação de um
clima de confiança e o fortalecimento
do empreendedorismo. Se não podemos evitar as especulações que agitarão
o mercado financeiro nos próximos
meses, ao menos temos a obrigação de
construir uma agenda com foco nos ganhos nada voláteis proporcionados pelo
desenvolvimento auto-sustentável.
Emerson Kapaz, 47, deputado federal pelo PPS-SP, é candidato à reeleição. Foi secretário da
Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Econômico do Estado de São Paulo (governo Mário Covas).
E-mail: emerson@kapaz.com.br
Texto Anterior: TENDÊNCIAS/DEBATES Ricardo Seitenfus: Confissão incompleta Próximo Texto: Painel do Leitor Índice
|