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DESARMAR A ARMADILHA
À diferença do que se imaginava, depois de longos anos na
oposição o Partido dos Trabalhadores chegou ao poder levando em sua
bagagem não muito mais do que as
conhecidas generalidades sobre os
males que afligem o país. A expectativa de que haveria idéias e projetos
em estado avançado de formulação
para dar consequências práticas às
diversas linhas do discurso político
frustrou-se com o lançamento do
primeiro programa de impacto -o
"Fome Zero". Não foi preciso muito
tempo para perceber que, por detrás
da retórica assistencialista, à qual a
sociedade entusiasticamente aderiu,
não se encontrava um plano que representasse avanço significativo em
relação aos programas de renda mínima anteriormente implantados.
Mesmo em questões de longa permanência na agenda do país, como
as reformas previdenciária e tributária, para as quais, poder-se-ia supor,
o PT já sistematizara propostas e alternativas, nada de novo apresentou-se. Em quase todas as áreas foi-se
constatando, ao longo dos últimos
seis meses, que as políticas de governo estavam, na realidade, sendo elaboradas praticamente a partir do zero, muitas delas pressionadas pela
necessidade de o Planalto apresentar
uma "agenda positiva", capaz de
produzir fatos políticos e midiáticos
em contraposição aos efeitos negativos da conjuntura econômica.
Foi justamente nessa área essencial, a da economia, que a nova administração mostrou-se menos improvisada. Não, porém, para implantar
as mudanças anunciadas em campanha, e sim para repetir com maior rigidez a política econômica anterior,
tão execrada pelo PT.
As razões que fundamentaram essa
opção são conhecidas. Além dos
contratos a serem respeitados -entre eles o acordo com o FMI-, a percepção de que medidas mais coerentes com a ideologia petista viessem a
ser adotadas seria o sinal para que os
mercados levassem o país a uma moratória das dívidas interna e externa.
Nesse caso, o primeiro ato do governo seria repetir no Brasil o desastre
do "default" ocorrido na Argentina.
Decidiu-se, então, restabelecer o
equilíbrio precário do modelo que
estava em curso, recorrendo à terapia
clássica: elevação da taxa de juros e
dos depósitos compulsórios com a
consequente retração da atividade
econômica. Tratava-se de "matar e
esquartejar" a inflação, na síntese do
ministro da Fazenda. Os resultados
apareceram: a economia entrou em
trajetória recessiva, instaurou-se um
clima de paralisia, o desemprego aumentou, mas a inflação retrocedeu
fortemente, a cotação do dólar caiu e
o famigerado risco-país recuou.
Assim, o PT construiu rapidamente
sua credibilidade diante dos mercados internacionais, ao mesmo tempo que começou a vê-la, paulatinamente, esvair-se entre os que depositaram esperanças numa gestão
anunciada -para usar o jargão-como mais "desenvolvimentista".
Na tentativa de conter uma possível
e perigosa debandada de apoios, o
governo vai lançando "pacotes", como o do microcrédito ou o do "desenvolvimento" (prestes a vir a público), pretendendo com isso minimizar os efeitos mais imediatos de sua
opção econômica. Generaliza-se,
contudo, a impressão de que mesmo
no longo prazo a nova administração candidata-se a repetir a dinâmica, bastante conhecida nos últimos
anos, de ciclos de crescimento moderado seguidos de crise externa,
descontrole cambial, aumento da inflação e nova elevação de juros.
Os desdobramentos do cenário
atual são uma incógnita. Resultados
medíocres na economia poderão fortalecer os quadros do pensamento
econômico do PT, alijados da atual
equipe, que passariam a contar com
apoio das forças decepcionadas com
o continuísmo. O governo ver-se-ia
pressionado a mudar ou o comando
da economia ou os rumos de sua política -provavelmente ambos.
A alternativa otimista seria os
atuais gestores da economia, valendo-se da credibilidade conquistada,
promoverem ajustes, desarmando as
armadilhas da vulnerabilidade externa e redirecionando o modelo em vigor. Dessa forma, com algum auxílio
da sorte na área externa, seria possível obter crescimento mais expressivo e relativamente sustentável, apaziguando os ânimos e recompondo a
coesão em torno do Planalto.
Quanto às hipóteses pessimistas,
melhor, por ora, deixá-las de lado.
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