São Paulo, sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

ELIANE CANTANHÊDE

O homem e o mito

BRASÍLIA - Lula cumpre hoje o último dia de seus oito anos como presidente do Brasil, um país "abençoado por Deus e bonito por natureza", com um crescente papel na construção de um mundo mais justo e mais pacífico.
Ao subir a rampa, em primeiro de janeiro de 2003, Lula carregou com ele uma história de vida incontrastável e uma nítida boa vontade de pobres, de ricos e da classe média que antes o rejeitava. Ao descer, em primeiro de janeiro de 2011, deixa um raro registro de sucesso para a história.
Ele pegou o bonde da estabilidade andando e tocou em frente, movido por um ambiente internacional francamente favorável e por sua estrela, inteligência, intuição, carisma e empatia com o seu povo.
Em seu governo, milhões de pessoas saíram da miséria, geraram-se empregos, ampliou-se o crédito, famílias pobres entraram no mercado consumidor. Ele ficou com o carimbo da justiça social num país sempre tão cruelmente desigual.
Mas Lula mostrou também um outro lado. Não enfrentou crises de frente, apropriou-se de méritos de adversários, jogou o mensalão no colo de Dirceu, Genoino e Delúbio, fingiu que o caos aéreo não era com ele, descartou as reformas política, trabalhista, tributária e previdenciária, permitiu (ou garantiu?) que seu filho se tornasse um "Ronaldinho" do dia para a noite.
É de Clóvis Rossi a melhor definição de Lula: ele é inimputável. Diz e faz o que quer, com quem quer, na hora que quer. A sua verdade passou a ser a verdade nacional. O Estado é ele! Quando a Petrobras trocou o nome de Tupi pelo de Lula, empresa e presidente estavam rindo da cara dos 44 milhões que não votaram em Dilma.
Lula desce a rampa idolatrado dentro e fora do país e inebriado por um balanço que lhe é inegavelmente favorável. Mas a vida continua, a história está sendo escrita. Fora do poder, o desafio do homem Lula será sustentar o mito Lula.

elianec@uol.com.br


Texto Anterior: São Paulo - Fernando de Barros e Silva: Soluço como metáfora
Próximo Texto: Rio de Janeiro - Ruy Castro: Música entre panelas
Índice | Comunicar Erros



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.