|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros
Placar da vitória é mais apertado desde 89
Eleição da primeira mulher será também a primeira sucessão de 3 presidentes eleitos diretamente em 84 anos
Eleita será a segunda a
chegar ao Planalto sem
ter disputado eleição
anterior e terá a maior
coalizão, de 10 partidos
FERNANDO RODRIGUES
DE BRASÍLIA
Apontada candidata por
Luiz Inácio Lula da Silva, Dilma Vana Rousseff, 62, a primeira mulher eleita presidente do Brasil, não superou
a votação do mentor. Lula
continua o presidente com a
maior votação da história -
teve 61,3% dos votos válidos
no segundo turno de 2002.
Além da questão de gênero, há vários outros fatores
históricos inéditos na escolha de Dilma para ser o 40º
presidente do país.
Quando receber a faixa
presidencial de Lula, Dilma
protagonizará um ato que
não acontecia no país havia
84 anos, desde 1926, quando
Arthur Bernardes entregou o
cargo a Washington Luís.
Como registrou em um artigo em setembro o jornalista
Elio Gaspari, assim como
Washington Luís, a presidente eleita conquistou o
cargo pelo voto direto e receberá o país das mãos de outro
cidadão escolhido da mesma
forma -e que, por sua vez,
também chegou ao Planalto
sucedendo outro governante, Fernando Henrique Cardoso, escolhido nas urnas.
Mas há uma peculiaridade
extra. Washington Luís havia sido senador por São Paulo antes de ser presidente. Já
Dilma nunca disputou uma
eleição na vida antes dessa.
Esse feito ocorreu só uma
vez no Brasil, há 65 anos: o
marechal Eurico Gaspar Dutra foi eleito por meio do voto
direto, em 1945, sem experiência anterior nas urnas.
CONTINUIDADE
Lula ter conseguido eleger
sua sucessora também é algo
raro na política brasileira.
O próprio presidente costuma se vangloriar que mesmo governantes populares,
como Juscelino Kubitschek,
não conseguiram transferir
seu prestígio aos candidatos
que apoiaram à sucessão.
O caso mais recente em
que houve continuidade foi
também atípico: Fernando
Henrique Cardoso foi eleito
em 1994 com o apoio de Itamar Franco, que o indicara
ministro da Fazenda para implementar o Plano Real.
Mas Itamar assumira a
Presidência após o impeachment de Fernando Collor, para um mandato de dois anos.
Antes disso, o último presidente a apoiar a eleição pelo voto direto de seu sucessor
foi por Getúlio Vargas em
1945, dando suporte ao marechal marechal Dutra.
Dilma chegará ao Palácio
do Planalto com o lastro da
mais ampla aliança partidária montada em torno de um
candidato vitorioso até hoje.
A presidente eleita contou
com o apoio oficial recorde
de dez partidos que integraram a coligação "Para o Brasil seguir mudando": PT,
PMDB, PC do B, PDT, PR,
PSB, PSC, PTC, PTN e PRB.
Serra, o segundo colocado, concorreu pela chapa "O
Brasil pode mais", com seis
siglas: PSDB, DEM, PTB,
PPS, PMN e PT do B.
O PMDB comandou o processo de redemocratização
do Brasil, no início da década
de 80, mas esta é também a
primeira vez que participa de
uma chapa vitoriosa numa
eleição presidencial direta.
PERFIL
Casada duas vezes, hoje
divorciada, mãe de uma filha
e com um neto nascido em
setembro, Dilma é economista de formação e socialista
por definição ideológica.
Leitora contumaz, cultiva
também hobbies pouco conhecidos, como ouvir música em um iPod e mergulhar
no mar ou em rios com o auxílio de cilindro de oxigênio.
Num país que enfrentou
duas décadas de estagnação
e momentos de inflação descontrolada, ela é a segunda
pessoa formada em economia eleita presidente da República. O outro foi Collor.
Filha de um búlgaro naturalizado brasileiro, Pétar
Russév (depois Pedro Rousseff), e de uma professora,
Dilma Jane Silva, natural de
Friburgo (RJ), Dilma nasceu
em Belo Horizonte (MG), em
14 de dezembro de 1947.
Quando tomar posse, será
a oitava mineira a ocupar o
cargo de presidente. Minas
Gerais lidera esse ranking,
que tem o Rio Grande do Sul
no segundo lugar, com seis.
GUERRILHA
Dilma será também a primeira ex-guerrilheira a comandar o Palácio do Planalto. Militou em organizações
de esquerda desde os 16
anos, em Belo Horizonte.
Em 1968, passou a viver na
clandestinidade. Usava documentos e nomes falsos como Estela, Luísa, Marina, Patrícia e Wanda. Atuava, sobretudo, no Rio e em São
Paulo. Em um dos documentos forjados, declarava ter
nascido no em São João da
Boa Vista, no interior de SP.
Em janeiro de 1970, aos 22
anos, foi presa em São Paulo.
Torturada nas primeiras semanas, cumpriu pena acusada de subversão. Ao sair da
prisão no final de 1972, mudou-se para Porto Alegre
(RS), onde morava e ainda vive seu segundo marido.
Dilma nega ter participado
de ações armadas enquanto
esteve na clandestinidade.
Admite apenas ter participado de treinamento militar
clandestino no Uruguai.
Ex-ministra das Minas e
Energia (2003-2005) e da Casa Civil (2005-2010), Dilma
construiu sólida carreira como burocrata de vários governos no Rio Grande do Sul.
Nos anos 70, aproximou-se
do MDB, o partido de oposição consentida à ditadura.
Só teve uma incursão frustrada na iniciativa privada.
Abriu uma loja de bugigangas na década de 90, em Porto Alegre. A Pão & Circo vendia itens de pequeno valor,
como brinquedos inspirados
no desenho animado japonês "Cavaleiros do Zodíaco".
Abandonou a atividade
comercial depois de um ano
e cinco meses, em julho de
1996. Essa experiência como
empresária não aparece em
sua biografia oficial.
Com a abertura política,
ajudou a fundar o PDT. Seguidora de Leonel Brizola
(1922-2004), rompeu com o
brizolismo em 2000 para permanecer na administração
do petista Olívio Dutra na
Prefeitura de Porto Alegre.
Filiou-se ao PT em 2001.
SAÚDE
No ano passado, descobriu um câncer no sistema
linfático. Submetida a radioterapia e quimioterapia, a
petista foi dada como recuperada no final de 2009. Faz
exames regulares para monitorar a saúde. Durante a campanha, não divulgou boletins médicos detalhados.
Na campanha, foi disciplinada: mudou o vestuário, tirou os óculos, fez intervenções plásticas no rosto e na
região do pescoço e aceitou a
contratação de um "hair
stylist" para modernizar seu
corte de cabelo.
Sua loquacidade ainda está distante da de um político
profissional. Mas quem compara a Dilma de hoje com a
de um ano atrás nota enorme
diferença. Controlou parcialmente a impaciência. Parou
de chamar repórteres de
"santinha" ou "santinho",
em tom de reprimenda.
A partir de hoje terá de começar a pensar na nomeação
de 37 ministros e cerca de 20
mil funcionários em cargos
comissionados. É uma incógnita como acomodará todos os partidos aliados e como se relacionará com Lula.
Terá de conciliar essas decisões políticas com sua
maior meta anunciada, a de
erradicar a pobreza extrema
do Brasil até 2014.
Texto Anterior: Leia íntegra do discurso da presidente Próximo Texto: Projeto Dilma decolou com pré-sal e PAC Índice | Comunicar Erros
|