São Paulo, sábado, 10 de outubro de 1998 |
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice O Brasil tem sentido?
DANIEL AARÃO REIS
A contrapartida política deste tipo de economia são instituições fechadas, impotentes para diagnosticar e resolver os problemas, uma "democracia restrita", e ainda sendo golpeada pelas reformas constitucionais em curso. Mas, afinal, dizem as xuxas e os poderosos, de que serve falar desta situação deprimente, e cultivar esta maldita "fracassomania"? O que importa é que o país melhora a olhos vistos, basta ver as mudanças radicais operadas depois do Plano Real. Não é o que mostram os autores de "A Opção Brasileira". Certo, o consumo das populações pobres melhorou, o que tem notável impacto político a curto prazo. Mas a tendência à concentração da renda continua. Com efeito, lucros, juros e aluguéis, que detinham, em 1994, 38% da renda nacional, dois anos depois, já abocanhavam 41%. Como poderia ser de outra forma, numa conjuntura em que o desemprego se eleva, a produção cresce pouco ou se estagna e os juros disparam? Sem falar no tique-taque incômodo das bombas-relógios com as quais será preciso, um dia, lidar -as dívidas impagáveis: a externa -pública e privada- e a dívida mobiliária federal, que pulou de R$ 59,5 bilhões, em julho de 1994, para R$ 254,5 bilhões em dezembro de 1997, o que mantém as elites dirigentes em permanente sobressalto, curvadas diante do capital especulativo, atraído por juros cada vez mais altos, e das instituições internacionais, de cujo aval dependem cada vez mais. Ou seja, o Plano Real atacou os efeitos, não as causas. Para enfrentá-las é preciso construir alternativas. O texto ousa propô-las. Mudar a concepção de desenvolvimento, retomando os conceitos de planejamento estratégico e regulação das forças cegas do mercado. Formular um programa de reconstrução nacional. Refundar o Estado. Nacionalizar os bancos. Estabelecer o controle público dos meios de comunicação. Mobilizar as amplas maiorias, em especial os trabalhadores. Ampliar a democracia, combinando representação e participação. Como os Estados Unidos no século 19 e a China no século 20, recusar o lugar que está sendo atribuído ao país pelas ordens e pela lógica do sistema internacional. Integrar a América Latina, autonomamente em relação ao grande irmão do Norte. Articular as potências chamadas intermediárias na cena internacional, construindo um contrapeso à hegemonia dos centros capitalistas avançados. Um toque épico, sem dúvida. No universo do Mesmo em que vivemos, onde se entrelaçam o cinismo e o conformismo, (re)aparece uma gente estranha, oferecendo diagnósticos contundentes e propostas de rupturas. Que futuro os aguardará? A estes que, lembrando a arte da guerra do velho Sun-Tzu, recusam o desespero e o medo? Se perderem, o que é provável, serão escarnecidos como utópicos, é este o destino dos que lutam na contracorrente. Se ganharem, não faltarão sisudos cientistas sociais que provarão por A + B a existência de condições maduras e favoráveis a suas propostas. Enquanto a Sorte não se decide, estarão lutando. Porque este é um livro de luta. Que só aos interessados na luta interessará. Daniel Aarão Reis é professor de história contemporânea na Universidade Federal Fluminense (UFF). Texto Anterior | Próximo Texto | Índice |
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