Ribeirão Preto, Domingo, 04 de Março de 2001

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EDUCAÇÃO PARA POUCOS
Dos 594 estudantes que ingressaram no campus de Ribeirão Preto, apenas 3 são da raça negra
USP tem menos de 1% de calouros negros

Lucio Piton/Folha Imagem
O aluno Álvaro Frederico Lemos da Silva, na moradia estudantil do campus da USP Ribeirão Preto


CAROLINA ALVES
DA FOLHA RIBEIRÃO

Apenas 0,6% dos calouros que ingressaram na USP (Universidade de São Paulo) no campus de Ribeirão Preto neste ano são negros. De um total de 594 alunos, 90% são brancos, 4,8%, amarelos, 4,4%, pardos, e 0,2%, indígenas.
A porcentagem de negros entre os estudantes da USP de Ribeirão é ainda menor do que a registrada entre os universitários que fizeram o Provão no ano passado.
Segundo o MEC (Ministério da Educação), a taxa de alunos negros em todo o país foi de 2,2%; a de brancos, 80%.
Só para se ter uma comparação, nos EUA, os negros são 11% dos estudantes universitários (contra 73,2% dos brancos).
O dado com a cor de pele foi inserido na pesquisa deste ano- realizada junto aos matriculados- estimulada pelo Movimento de Conscientização da Cultura Negra, existente no campus central, na capital.
De acordo com o reitor da USP, Jacques Marcovitch, o problema é social e não apenas racial. "Defender cotas de minorias nas universidades não é solução para o problema. Solução é a reforma no ensino."
Para o aluno negro do curso de psicologia Álvaro Frederico da Silva, 29, a raça é minoria devido à exclusão social.
"Não houve muita evolução dos negros desde a época do trabalho escravo. Eu posso me considerar uma minoria dentro da minoria, já que sou de classe média e estudei em escola particular. É difícil encontrar isso."
Já William Ferreira Alves, 22, diz que a discriminação acontece não somente com os negros.
"Aqui na universidade eu posso dizer que sou privilegiado, mas tenho um amigo, branco, que é pobre, passou em química neste ano e foi maltratado por colegas por estar mal vestido", afirmou, sem querer apresentar o colega.
Alves conta que é o único de sua família que teve condições de entrar numa universidade. "Sou de classe média baixa e sou a exceção da família."
Ainda segundo a pesquisa da USP, o curso mais sem mistura de raças é o de administração, onde 100% dos calouros são brancos.
Os únicos cursos que possuem alunos negros -dos 11 existentes no campus de Ribeirão -são os de química, com 6%, e enfermagem, com 1%.
O educador da Unesp (Universidade Estadual Paulista) de Assis Carlos da Fonseca Brandão afirmou que esses dados devem ser analisados em conjunto com outros da pesquisa, como o fato de 52% possuírem renda acima de R$ 2.500, 84% usarem Internet, 50% dominarem o inglês e 84% terem terminado o ensino médio em escolas particulares.
"Uma análise combinada de todos esses fatores mostra claramente o que acontece no país com o ensino público. É o retrato perfeito da falência do ensino médio e fundamental."
O aluno ribeirão-pretano José Eduardo Foleto, 25, realizou os estudos do ensino fundamental e médio somente em escola pública e ainda fez supletivos. Entrou neste ano em economia na USP sem a realização de cursinho, sendo também uma minoria.
Foleto conta que, quando foi realizar supletivo à noite - porque trabalha- , o diretor disse que não havia mais vagas.
"Eu insisti e disse que queria muito estudar. Ele acreditou em mim e valeu a pena."
Ele afirma que optou pelo curso de economia por ser noturno e também por complementar o trabalho atual, de comerciante.
Foleto se sente veterano perto dos colegas de sala. Sua idade é uma das mais altas da turma.



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