Ribeirão Preto, Segunda-feira, 05 de Janeiro de 2009

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Lista de violência policial inclui a região

Morte do catador de papelão Juliano Diogo e de ex-interno da Febem Cleonder fazem parte de trabalho elaborado pela PUC

Nos dois casos, inquéritos foram arquivados sem apontar culpados pelas mortes; especialistas veem padrão na ação da polícia

JULIANA COISSI
DA FOLHA RIBEIRÃO

Um jovem catador de papelão, de 26 anos, morto com seis tiros pela Polícia Militar em Ribeirão Preto. Um ex-interno modelo da antiga Febem que volta à cadeia e morre por suspeita de negligência no CDP (Centro de Detenção Provisória) de Araraquara. Os dois casos foram arquivados.
As duas situações recheadas de indícios de abuso e erros cometidos por policiais na região integram uma lista da violência policial em todo o Estado. O mapeamento foi organizado pelo Observatório das Violências Policiais, ligado à PUC (Pontifícia Universidade Católica) de São Paulo.
Na maior parte dos casos, pesquisadores identificam padrões na ação da polícia, o de "atirar primeiro para perguntar depois" e de o ferido chegar morto após ser transportado pelo carro da polícia.
O observatório selecionou 115 casos de tortura, violência e abuso de policiais ocorridos desde 1997, a partir de notícias de 120 jornais paulistas. Na região, o mais recente deles é de 2006 que teve como vítima o catador de papelão Juliano Diogo, 26, que morava na favela Simioni, em Ribeirão.
A morte ocorreu dois dias depois do início dos ataques do PCC, dias em que se multiplicaram em todo o Estado denúncia de mortos pela polícia sem uma explicação aparente.
No caso de Juliano, a versão da polícia é de que ele correu com arma nas mãos e atirou nos carros dos policiais militares. Nenhum deles se feriu, mas Juliano morreu baleado.
Entretanto, a história contada por testemunhas é que quatro PMs desceram do carro e abordaram Juliano. "Não deu nem tempo de ele falar nada. Chegaram atirando", disse uma testemunha à Folha, na época. Primeiro, foi um tiro no abdômen. Depois, disse a testemunha, o catador foi arrastado e levou mais três tiros: na cabeça, no peito e nas costas.
Ainda segundo a testemunha, depois de morto, os PMs colocaram uma arma na mão de Juliano e simularam disparos contra o carro policial. A versão oficial é de que uma ambulância o socorreu. Mas a família e vizinhos dizem que foi a polícia que o transportou.
Durante as investigações, surgiram divergências nos depoimentos das testemunhas. Em 2007, o inquérito da Polícia Civil foi concluído sem indiciar nenhum PM por entender não haver provas de que houve execução policial. "Pelas provas, houve homicídio, mas não caberia indiciamento", disse à Folha na época o delegado Carlos Alberto Silva.
Em julho deste ano, o Ministério Público pediu arquivamento do caso, que foi acatado pela Justiça. O promotor criminal José Roberto Marques disse que baseou seu pedido em provas da perícia e em versões contraditórias das testemunhas sobre fatos relevantes, como ter visto ou não os PMs "plantarem" a arma nas mãos de Juliano.
A reconstituição do crime descartou que as testemunhas pudessem ter visto com nitidez a cena devido à distância que estavam e à baixa iluminação.
Para a família de Juliano, o arquivamento do inquérito soa como impunidade. "A gente é lixo para eles", disse a mãe, Irene Diogo, 51. Até hoje, eles esperam indenização do Estado.

Negligência
O outro registro é o de Cleonder Santos Evangelista, morto aos 20 anos. Ele passou, em pouco mais de dois anos, de garoto-símbolo do que seria uma Febem bem-sucedida, quando passou em direito em 2003, para vítima das condições do sistema prisional.
Começou o curso e escreveu um livro. Mas voltou para a cadeia, onde morreu por pneumonia e falência múltipla dos órgãos, em 2005, no CDP de Araraquara.
Segundo familiares, Cleonder morreu por causa do tratamento recebido na prisão e de negligência no atendimento. O inquérito da morte foi encaminhado em 2006 para a Vara Criminal de Araraquara e arquivado em março de 2007.


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