Ribeirão Preto, Domingo, 13 de setembro de 1998

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ENTREVISTA DE DOMINGO
Para promotor, ambição leva jovem à criminalidade

da Redação

O aumento da violência nos crimes cometidos por adolescentes é um dos fatores responsáveis pelo crescimento de mortes de jovens egressos da Febem (Fundação para o Bem-Estar do Menor) de Ribeirão Preto.
Para o promotor Luiz Henrique Pacini Costa, da Vara da Infância e Juventude, há alguns anos, os adolescentes infratores eram de famílias pobres e cometiam principalmente pequenos furtos. "Hoje, os meninos já entram no crime mais grave, como o roubo à mão armada", afirma Pacini Costa.
No último dia 4, os jovens L.C.S.T. e P.W.F.V., ambos de 17 anos, e Genoé Ferreira da Silva Jr., 20, foram mortos em uma chacina em um canavial na periferia de Ribeirão. Dois policiais militares são acusados de matar os jovens e outros dois, de terem presenciado a cena sem tomar atitude.
Leia a seguir os principais trechos da entrevista do promotor.

Folha - O senhor já está investigando desde o ano passado a possibilidade de existência de um grupo que mata adolescentes que saem da Febem. Por que o senhor decidiu iniciar a apuração?
Luiz Henrique Pacini Costa - Como nós tínhamos notado que vários meninos egressos da entidade estavam morrendo com muita frequência, passamos a analisar essa situação. O fato de não ter a autoria do homicídio nos preocupa porque estamos vivendo um momento de extrema violência. Surge um descontentamento geral e cria-se um clima propício para o surgimento de movimentos que acham que a justiça possa ser feita com as próprias mãos.
Folha - A chacina do dia 4 poderia ter alguma relação com isso, já que os dois rapazes de 17 anos tinham passagem pela Febem?
Pacini Costa - Tudo depende da investigação. Eu não tenho a atribuição específica sobre esse caso, mas como eu estava de plantão no fim-de-semana, eu acabei tendo o primeiro contato com a situação. A minha preocupação inicial era conversar com o taxista, que era a principal testemunha que nós tínhamos até então, e com os familiares dos meninos. Nós também fomos ouvir os policiais.
O que revela uma certa preocupação é que a decisão de ir para o canavial foi muito rápida, muito determinada dos dois policiais. Isso revela que já aconteceu em outras vezes; mesmo que não tenham havido mortes, eles já deveriam ter ido ao canavial para praticar atos ilícitos, abusos ou agredido algumas pessoas. O que eu concluo é que é estranho esse "ir ao canavial" e isso revela, não da parte dos dois que denunciaram, mas dos dois que estão sendo mais responsabilizados, uma coisa que aparentemente é rotineira.
Agora, o comando da Polícia Militar se mostrou muito preocupado com isso. Eles não estão medindo esforços para elucidar o caso.
Folha - Levantamentos mostram que o número de adolescentes que são assassinados depois que saem da Febem tem aumentado. Foram três meninos em 95, 12 em 96, 24 no ano passado e 26 em 98, até o dia 8. O que está provocando o aumento?
Pacini Costa - Hoje em dia, qual a perspectiva de um menino que nasce em uma família desfavorecida? Ele tem uma escola que não é estimulante, tem que trabalhar para poder conseguir dinheiro para comer, não tem uma estrutura familiar que dê respaldo a ele e não tem o Estado para suprir deficiências. Então, ele vai acabar necessariamente sendo empurrado para a criminalidade. E a criminalidade vai continuar crescendo porque nós não estamos enfrentando isso de uma forma correta.
Folha - A violência cometida pelo adolescente hoje é diferente da de alguns anos atrás?
Pacini Costa - Totalmente diferente. Mais ou menos em 92, nós tínhamos uma manifestação do comércio local dizendo que o problema eram os "meninos dos pés no chão", que eram aqueles que ficavam no centro da cidade, praticavam pequenos furtos e que não havia nada que pudesse ser feito. Hoje, esses meninos não representam absolutamente nada na criminalidade porque eles não são ambiciosos. O que eles querem é ter o que comer e ter um pouco para comprar droga. A partir de 92, emerge um novo tipo de violência, uma violência que está sendo praticada em uma classe média baixa, com um perfil diferente de moradia, escolaridade. Antes, as coisas evoluíam de pequenos furtos a coisas mais graves até chegar ao roubo ou ao tráfico. Hoje não há mais essa evolução. Os meninos já entram no crime mais grave, como o roubo à mão armada. A razão disso, eu presumo que seja a propaganda maciça, o querer ter e não poder, drogas e famílias sem estrutura.



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