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ANÁLISE
De quem é a culpa por uma epidemia de dengue?
ROBERTO MEDRONHO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Essa simples pergunta possui
uma complexa resposta. Inicialmente, deve-se deixar claro
que a execução das ações de
combate à doença é atribuição
dos municípios. Entretanto, essa atividade deve ser complementada pelos governos estaduais. Por outro lado, é o governo federal quem normatiza as
ações de controle e provê os recursos necessários aos governos estaduais e municipais.
Destaca-se também o importante papel da sociedade por
meio de atividades de mobilização social e de cobrança das autoridades públicas para que
cumpram adequadamente a
sua função. Obviamente, sem
esquecer-se de realizar o seu
dever de casa, literalmente.
Desafortunadamente, a única forma de se combater é controlando o seu vetor, pois ainda
não se dispõe de tratamento específico nem de vacina eficaz e
segura. No Brasil, as condições
socioeconômicas e ambientais
aliadas à ineficiência crônica
dos programas de combate em
muitas cidades fazem com que
o processo epidêmico seja modulado pelo esgotamento de indivíduos suscetíveis à doença
na população, ao invés de um
adequado controle do vetor.
Ou seja, as epidemias se sucedem quase que como um processo "natural". Costuma-se fazer referência jocosa à dengue
como sendo a "crônica de uma
epidemia anunciada".
Claro está que fatores importantes na produção da doença
fazem com que a tarefa de combate seja muito complexa. Muitos destes fatores extrapolam
os marcos da saúde: crescimento desordenado, condições de
moradias inadequadas, inexistência ou irregularidade no
abastecimento de água, destinação inapropriada de resíduos
sólidos e intenso trânsito de
pessoas e cargas entre regiões e
países, provocando um grande
tráfego de vírus e mosquitos.
Além disso, o aquecimento global favorece o desenvolvimento do mosquito infestando regiões limítrofes aos trópicos até
então indenes à doença.
Por tudo isso, é válido dizer
que a dengue é um problema
que se expressa no setor saúde,
não sendo específico deste. Assim, é fundamental para o êxito
uma ação intersetorial efetiva.
Finalmente, a resposta à pergunta poderia ser: a despeito da
responsabilidade das secretarias municipais de saúde nas
ações de combate, sem uma
adequada articulação entre os
distintos níveis de governo,
sem uma efetiva participação
da sociedade e sem uma boa articulação intersetorial, a difícil
tarefa de combate à dengue torna-se uma luta inglória.
ROBERTO MEDRONHO é epidemiologista, chefe do Departamento de Medicina Preventiva da
UFRJ
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