Ribeirão Preto, Domingo, 29 de Julho de 2001

Próximo Texto | Índice

ECONOMIA
Empresa fez manobra contábil para não transferir a acionistas, entre eles a Prefeitura de Ribeirão, lucro de 99
Manobra da Telefônica "some" com R$ 2 mi

EVANDRO SPINELLI
DA FOLHA RIBEIRÃO

A Telefônica fez uma manobra contábil no balanço da Ceterp (Centrais Telefônicas de Ribeirão Preto S.A.) de 1999 para não distribuir cerca de R$ 2 milhões de seu lucro a funcionários da empresa e acionistas minoritários -entre eles, a prefeitura.
Em um balancete dos resultados da Ceterp obtidos entre janeiro e setembro daquele ano apresentado à CVM (Companhia de Valores Mobiliários), a empresa teve um lucro de R$ 13,578 milhões no período.
A previsão da então diretoria da Ceterp -empresa com capital municipal que foi criada em 1969- era que a empresa tivesse um lucro naquele ano de pelo menos R$ 15 milhões. Considerando o valor mínimo com a distribuição de lucros aos funcionários, prevista no contrato coletivo dos telefônicos, e o pagamento de dividendos aos acionistas minoritários, a Telefônica teria de desembolsar R$ 1,962 milhão.
Desse total, os funcionários ficariam com R$ 937,5 mil -quase R$ 1.000 para cada contratado da empresa. A prefeitura teria direito a R$ 287,6 mil, o IPM (Instituto de Previdência dos Municipiários), a outros R$ 66 mil, e os demais acionistas -compradores de telefones em planos de expansão e de ações em bolsa de valores-, a outros R$ 671,25 mil.
Só que o lucro não aconteceu. No balanço final do ano, que compreende os períodos do lucro de mais de R$ 13 milhões mais outubro, novembro e dezembro, "apareceu" um prejuízo total de R$ 28,476 milhões.
Por causa da manobra contábil, o promotor da Cidadania de Ribeirão Preto, Sebastião Sérgio da Silveira, entrou com uma ação civil pública contra a empresa espanhola. Para ele, o processo pode ser qualificado como fraude.
A Telefônica justificou, nas notas explicativas do próprio balanço, que o que gerou o prejuízo foi a reserva de valores de impostos a serem pagos e de demissões que aconteceriam no ano seguinte.
Somente para o PDIV (Programa de Demissões Incentivadas e Voluntárias) a Telefônica reservou R$ 33 milhões. Só que as demissões não estavam previstas nem mesmo pela própria empresa, quando tomou posse da administração da Ceterp.
A Ceterp teve seu capital aberto em 1996 durante a primeira administração do petista Antônio Palocci Filho. Foi vendida ao grupo espanhol em dezembro de 1999 -no governo do tucano Luiz Roberto Jábali-, após um tumultuado processo de privatização -com direito a protestos contrários e liminar na Justiça contra a negociação.
O economista Afonso Reis Duarte, ex-membro do Conselho de Administração da Ceterp, e o ex-presidente da empresa Rui Salgado Ribeiro afirmaram que a manobra contábil foi legal.
"Não fizeram nada fora do que a lei permite dentro dos aspectos contábeis", afirmou o também delegado regional do Corecon (Conselho Regional de Economia), Duarte. "Dentro do nosso plano de trabalho, o prejuízo não aconteceria", afirmou Ribeiro.
Os argumentos, no entanto, não convencem Silveira. "Maquiagem contábil ilegal para prejudicar os acionistas minoritários, trabalhadores e o fisco", "monumental prejuízo fabricado" e "verdadeiro assalto" são algumas das expressões utilizadas pelo promotor no texto de sua ação.
Silveira quer que o balanço de 99 seja considerado ilegal e que outro documento seja elaborado em substituição, "com a desconsideração de todos os valores tidos como fraudulentos".
"Eles transformaram um lucro monumental em um prejuízo milionário. Isso foi uma fraude."
A ação foi movida após a realização de um inquérito civil aberto com base em uma representação apresentada pelo diretor do Sindicato dos Telefônicos do Estado de São Paulo, José Roberto Silva, e pelo economista aposentado Paulo Afonso Artal.
"Ela [a Telefônica] tomou posse em 3 de janeiro [de 2000" dizendo que ia manter os funcionários, mas provisionou R$ 30 milhões para as demissões. Ou eles já pensavam em demitir ou alteraram o balanço que deveria ser fechado no final do ano fiscal", afirmou Artal.

Outro lado
A Telefônica informou anteontem, por meio de sua assessoria de imprensa, que não iria se pronunciar sobre o assunto.


Próximo Texto: Economia 2: Para ex-diretores, artifício usado foi legal
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.