São Paulo, domingo, 03 de agosto de 2008

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MODA

A Superpoderosa

por ALCINO LEITE NETO

A empresária que comanda nos bastidores a São Paulo Fashion Week diz que as roupas brasileiras ainda são mal-acabadas

No mundo da moda, o preto é uma cor quase sagrada, o sinal máximo da elegância. Há, porém, duas personalidades envolvidas visceralmente com a moda brasileira que jamais colocam roupas pretas: os irmãos Paulo e Graça Borges.

Eles são os criadores da São Paulo Fashion Week e sócios, com Denise Basso e Graça Cabral, da empresa Luminosidade, que produz o principal evento brasileiro de moda. "Não uso preto de jeito nenhum há muitos anos. O preto segura a energia, o branco a rebate", diz Graça Borges, que no máximo veste peças com estampas em negro. Ela e o irmão também cultivam o hábito de sempre trajarem branco total nas sextas-feiras, uma recomendação do candomblé, religião pela qual têm simpatia.

Nos outros dias da semana, o mais comum é encontrar Graça com roupas estampadas e de cores fortes, mas que ela usa com muita ousadia, particularmente na semana de moda. Durante o evento, sempre estará à porta de entrada dos desfiles, com seus modelos exuberantes. Mas não pense que é para exibi-los: é para controlar o tumulto dos fashionistas e a pontualidade da apresentação. "As pessoas da moda são como crianças", reclama.

Paulo Borges é atualmente o diretor de criação e de conteúdo da Luminosidade. Graça Borges é a diretora de produção. Ele é a imagem institucional da SPFW, aquela figura simpática que sempre aparece na mídia. Mais discreta, Graça é, porém, a toda-poderosa dos bastidores, aquela que vai viabilizar as operações mais difíceis, a pessoa que dirá "sim" e que dirá "não".

Por isso mesmo, Graça tem fama, entre os fashionistas, de ser austera e rigorosa, que não está aí para brincadeiras. Alguns tremem ao ter de se dirigir a ela -mesmo os estilistas mais incensados.

"Sou muito calma, mas também sou muito dura, não tenho meias palavras", diz a empresária. Tanto assim, que ela não pensa duas vezes ao definir o mundo da moda: "É a atividade que mais tem pessoas geniosas. Todos querem mandar e se consideram VIPs". E é implacável quando fala das roupas "made in Brazil": "Houve uma grande evolução da moda no país, mas as grifes ainda tem muitos problemas de acabamento. Há poucas que têm uma finalização excelente das peças".

A temporada do verão 2008/09 da SPFW terminou há quase dois meses, mas Graça e sua equipe já preparam há semanas a próxima fashion week, que acontece só em janeiro. Até chegar o dia D, ela vai contratar cerca de 10 mil itens necessários ao evento e os serviços de aproximadamente 2.500 pessoas. Vai cuidar desde aspectos arquitetônicos até detalhes de segurança -uma obsessão da empresária, que já fez cinco cursos no Corpo de Bombeiros.

Graça Borges raramente assiste aos desfiles. "Prefiro ver as roupas nos bastidores. Quando tenho que ir, fico rezando para que não seja comprido", afirma. Na última temporada, a única vez em que se sentou na primeira fila foi para ver a apresentação de seu amigo Lino Villaventura. Levava no colo o filho adotivo de Paulo Borges, Henrique. Para o garoto de três anos, Graça só sabe dizer sim. Ele é o novo queridinho da empresária e está, inclusive, tomando lições de pintura com ela.

Graça sempre gostou de fazer artesanato e há três anos começou a pintar cerâmicas e peças em gesso. Em maio do ano passado, fez uma exposição de santos, que ela vestiu de cores fortes e alegres. O São Jorge colorido que está na sede do Corinthians é obra dela.

O seu ateliê de criação ocupa um dos quartos do apartamento em que mora nos Jardins, em SP, acompanhada apenas de seu outro "darling", um cão da raça spitz alemão chamado Precioso. Aos 53, Graça fuma, bebe socialmente ("de preferência uísque") e não dispensa as sessões semanais de RPG e drenagem linfática.

Quase todo sábado à tardinha, faz sessões de "cinema e pipoca" com José Simão. "Ele arruma o DVD, eu arranjo a pipoca." Ao menos uma vez por mês, vai para a sua casa de praia em Arembepe (BA), antigo paraíso hippie, onde Paulo Borges é seu vizinho.

Paulo é um dos seus três irmãos. Há 30 anos, foi ela que se mudou primeiro de São João do Rio Preto para São Paulo. Formada em administração de empresas, trabalhou no extinto banco Comind. Paulo chegou à capital cinco anos depois dela.

Eles começaram a atuar juntos na moda produzindo figurinos para comerciais. Depois, resolveram organizar desfiles. E, pouco a pouco, foram surgindo os embriões da São Paulo Fashion Week -primeiro, o Phytoervas Fashion; em seguida, o Morumbi Fashion Brasil.

Sobre Paulo Borges, ela também não mede as palavras. "Conheço dois: o irmão e o meu chefe", ela diz. "Como irmão, ele é meigo, doce, uma pessoa que se doa aos outros. Como chefe, ele é muito criativo, mas também muito duro. Às vezes chega a ser agressivo." Graça conta que os dois já brigaram muito. "Hoje só discutimos", arremata. Tanto melhor para a moda brasileira.

"O meio da moda é cheio de pessoas geniosas, todas se acham VIPs"

Graça Borges, assinado por Alexandre Herchcovitch. 2. As estatuetas de santos pintadas pela empresária


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