São Paulo, domingo, 28 de março de 2010

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MODA - TENDÊNCIAS

Fashion weeks internacionais definem inverno entre desfiles virtuais e peles verdadeiras

por ALCINO LEITE NETO, de Paris, Londres e Nova York

INVERNO VIRTUAL

Temporada do outono-inverno 2010/11 em Paris, Milão, Londres e Nova York foi marcada pela adesão das grifes à transmissão de desfiles ao vivo pela internet

Para o desfile de sua coleção de inverno, neste mês, a Chanel mandou vir dos recantos gelados da Suécia um bloco de gelo de 265 toneladas. Ele foi instalado no Grand Palais, em Paris, e, ao seu redor, apresentaram-se as modelos, pisoteando com botas e sapatos de luxo a gigantesca poça d’água formada no cenário, com o derretimento progressivo do "iceberg".
Foi um espetáculo oneroso, superproduzido e cativante, mas a partir de uma ideia simples, senão óbvia: o inverno, o frio, o gelo...
Para completar o show, o estilista Karl Lagerfeld criou para a Chanel uma coleção recheada de peles fartas, de todos os tipos. Os fashionistas suspiravam: isso custará uma fortuna! Os ecologistas preparavam seus protestos: que matança cruel dos animais peludos!
Mas, atenção: ao contrário do bloco de gelo, que era autêntico, as peles eram todas falsas, uma imitação industrial perfeita.
A moda sempre foi feita assim: no limite entre a verdade e a mentira, entre a encarnação e a idealização, entre o real e a fantasia. Se tirarmos um lado, perdemos o outro, e o sistema fashion inteiro se desfaz, como gelo.
A temporada internacional do inverno 2010/11 –que Serafina acompanhou in loco em Paris, Milão, Londres e Nova York– foi acossada por outra dicotomia persistente da moda: a disputa entre o pragmatismo e o risco.
Ainda assustadas com a recessão econômica, as grifes deixaram que vigorasse o pragmatismo, ou seja, a roupa de entendimento fácil e convencional. É um tempo difícil para a indústria da moda, com as transformações que vêm ocorrendo na economia, na sociedade e na cultura. Às vezes, a moda parece uma velha instituição que insiste em sobreviver aos novos tempos –mais ágeis, mais versáteis e mais criativos que ela. Outras vezes, parece a ponta-de-lança da época, com sua capacidade de assumir e sintetizar as mutações em processo no mundo.
Uma dessas mudanças, que deve afetar profundamente o sistema tradicional de desfiles e até o mercado, é a transmissão ao vivo dos shows pela internet.
Essas transmissões –adotadas por várias grifes na última temporada– não apenas popularizam os desfiles, como tentam incrementar o consumo. A Burberry, por exemplo, difundiu a sua coleção ao vivo pela web para, em seguida, colocar à venda todas as roupas, sem esperar –como é a praxe– pela entrada efetiva da estação de inverno nas lojas (em meados do segundo semestre, no hemisfério Norte).
Outras várias grifes também fizeram transmissões ao vivo de suas coleções, às vezes acrescentando documentários e reportagens de bastidores, de maneira que os desfiles se tornassem programas de entretenimento maciço via internet.
Do ponto de vista da criação de moda, a temporada do inverno 2010/11 deverá deixar pouca memória na história fashion. Mas certamente será lembrada como momento decisivo da transformação dos desfiles –até agora reservados a uma elite de fashionistas– em uma nova experiência online para milhões de pessoas. Agora, gravitando entre o real e o virtual, o sistema da moda deverá passar por modificações radicais nos próximos anos.

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