São Paulo, domingo, 29 de Maio de 2011

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FINO

O mago da moda

por Julio Wiziack

Paulo Borges, criador da São Paulo Fashion Week e do fashion rio, diz que já tem dinheiro suficiente para se aposentar. mas não para de tirar ideias da cartola

Quando saiu de São José do Rio Preto, no interior paulista, para estudar em São Paulo, Paulo Borges não pensava em moda. Aos 18 anos, sua única referência do mundo fashion era a máquina de costura da mãe. Do pai, funcionário público, aprendeu que a "gente tem de dar o passo conforme o tamanho da perna". Foi uma lição logo esquecida. Sem medir o passo, Paulo Borges se transformou no patriarca da moda com sua empresa Luminosidade, que produz a SPFW (São Paulo Fashion Week), o Rio Summer e o Fashion Rio, que começa no dia 30 de maio. Em torno do empresário orbitam quase todas as empresas da cadeia da moda, que movimenta US$ 50 bilhões anualmente no país. Justamente por isso, no início deste ano, ele foi chamado pela presidente Dilma Rousseff para mostrar a ela as barreiras do setor. "Podemos exportar marcas, vender mercadorias com valor agregado", disse à presidente. Borges, 48, é a voz da moda brasileira e é esse seu maior patrimônio, talvez tão valioso quanto sua agenda (apelidada de "Bíblia" por um assessor devido ao volume de contatos). "Na vida, tudo é relacionamento", ensina. Pois foram esses contatos -e não dinheiro de investidor- que o ajudaram a chegar onde está.

PARAR DE TRABALHAR
"Nos primeiros dez anos, ganhei pouco dinheiro porque investi no evento", diz Borges, que fez o seu primeiro Morumbi Fashion em 1996. "Aliás, só passei a viver um pouco melhor quando eu já tinha 28 anos." As receitas aumentaram à medida que os patrocinadores engrossavam a lista de interessados do evento, que em 2001, se transformou na SPFW. Hoje, o evento custa R$ 15 milhões e movimenta R$ 1,8 bilhão em negócios diretos e indiretos. "Só para deixar tudo fresquinho gastamos R$ 400 mil com ar-condicionado." A grande injeção de capital chegou em agosto de 2008, com a venda da maior parte de sua empresa, a Luminosidade, para a InBrands, grupo de investimento formado por acionistas do banco Pactual. "Todo mundo acha que eu fiquei milionário depois dessa venda", diz. "É um exagero." Os valores dessa operação não foram revelados, mas ele afirma que a transação lançou a Luminosidade a um patamar mais elevado e, é claro, também ajudou a fortificar sua conta bancária. Para administrar suas finanças pessoais, tem um assistente. "Estaria mentindo se dissesse que monitoro minhas aplicações", diz. É conservador: "Invisto em CDB [títulos emitidos pelos bancos] e um pouco na poupança." Borges diz já ter dinheiro suficiente para parar de trabalhar. Mesmo assim, leva uma vida que considera "simples". Possui um apartamento na Bela Vista, em São Paulo, um carro da Fiat (Linea), um sítio em São Roque (SP) e dois imóveis na Bahia -em Salvador e em Arembepe. Sonho de consumo? "Nunca tive", diz. "Gasto um pouco com objetos de decoração. Sou fascinado por design, mas nada além da conta." Roupas? "No Brasil, nem pensar. Os preços das grifes estrangeiras são exorbitantes. Só compro quando viajo ao exterior." Para ele, é absurdo pagar R$ 10 mil em uma peça. No país, só compra grife nacional. "Adoro Hering", diz mostrando sua camiseta. Os óculos para o trabalho são da Chilli Beans. Quando gosta de uma peça usa até acabar. Segundo Augusto Mariotti, braço direito de Borges há 11 anos, Paulo ganha muitas roupas dos estilistas brasileiros. Quando compra algo, paga a prestação. "O país acabou com a cultura do pagamento à vista com desconto. Então, se não tenho desconto, parcelo mesmo", revela.

ASTROLOGIA
Paulo tem algumas manias. Obcecado pela perfeição, nada pode sair do roteiro. Costuma delegar a mesma tarefa a duas ou três pessoas para ter certeza de que será atendido e fica dedilhando sobre a mesa quando está ansioso. Sua memória é infalível. "Se ele pediu dez coisas e eu esqueço de uma, ele vai perguntar justamente sobre aquela que faltou", diz Mariotti. Até pouco tempo atrás, Borges ligava no meio da madrugada passando trabalho. Com a adoção de Henrique, 4, houve mudanças. Seus amigos dizem que ele está mais tranquilo e entendeu a importância da vida particular. "O destino vai me colocando nos lugares", diz. Ariano com o Sol e a Lua em seu signo, ele é um caso raro, segundo sua astróloga Lydia Vainer. "A chance do Sol e da Lua estarem no mesmo signo quando uma pessoa nasce é pequena", diz Vainer. "Por isso, ele mete as caras sem saber onde vai parar." Há uma década atendendo o empresário, Vainer afirma que "seu maior medo é ficar estagnado". O remédio contra isso é o crescimento da empresa. No mês passado, a Luminosidade fechou parceria com o grupo ABC, o publicitário baiano Nizan Guanaes, para produzir o Rio Summer. "Não entendo nada de moda exceto que a própria moda deve muito ao Paulo," diz Nizan Guanaes. "Ele é o melhor sócio que eu poderia ter. Não enche a paciência e toca o negócio para mim (risos)." Além dessa parceria, Borges se prepara para o lançamento do cartão fidelidade SPFW. O titular terá descontos em compras nas lojas das grifes credenciadas. Sua empresa também produzirá o Salão Design São Paulo que, em junho, reunirá 18 galerias e lojas do porte dos irmãos Campana. Frequentador do Gantois, um dos mais famosos terreiros de candomblé, é filho dos orixás Ogum e Oxum. Carrega no pescoço colares de contas na cor de seus guias (azul e amarelo, respectivamente) dados por Mãe Carmen, filha de Mãe Menininha. "É um kit proteção", diz. Caseiro e avesso a baladas, às vezes gosta de sair para jantar no Ritz ou no Rodeio. Seu maior orgulho foi ter sido clicado por Annie Leibovitz, célebre fotógrafa da revista "Vanity Fair", em Nova York. "Ele parecia criança de tão feliz e ficava ligando do estúdio para contar", diz Mariotti.

BANCÁRIO
Em São José do Rio Preto, Paulo teve seu primeiro emprego aos 14, como estagiário de um banco onde trabalhava com processamento de dados. Quatro anos depois, mudou-se para São Paulo, fez amigos e passou a frequentar a noite gay paulistana. Logo depois, um deles o indicou para trabalhar com Regina Guerreiro, então diretora da "Vogue". Paulo tinha 20 anos e, em dois, conheceu todos do setor, de costureiros a fabricantes de tecidos, passando por publicitários e até políticos, criando uma rede de relacionamento com todo o mercado da moda. Em 1992, ele deu um salto ao produzir o concurso de modelos "Elite Look of the Year". A experiência o levou a Carlos Sallum, superintendente do Morumbi Shopping. "Fechamos um contrato de dez anos para realizar desfiles no local", diz. O pulo do gato: os direitos da marca, Morumbi Fashion, ficariam com Borges... desde que ele conseguisse uma carta de compromisso confirmando a participação dos vinte estilistas mais importantes do país. Na era do fax, cumpriu a tarefa em dois dias e ganhou o contrato. Para Sallum, era uma chance de ouro, já que conseguiria atrair marcas de prestígio para o shopping, ganhando vantagem em relação à concorrência. Para Borges, a chance era de 24 quilates: tinha o calendário da moda brasileira aos seus pés. O resto é história.

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