Gilberto Dimenstein
colunista da Folha

O cineasta João Jardim inspirou-se em sua própria deficiência física -uma miopia de oito graus- para viajar por países recolhendo depoimentos de personalidades (todas com alguma deficiência visual) sobre o olhar. Dessa peregrinação surgiu o premiado documentário "Janela da Alma". "A forma como eu senti essa limitação, desde a minha infância, sempre me deixou intrigado em saber sobre como as pessoas olhavam o que estava ao seu redor." A limitação ocular transformou-se, porém, em uma metáfora sobre as diversas maneiras de perceber o mundo. Desde o ano passado, Jardim começou a buscar o olhar de adolescentes para outra deficiência -a deficiência escolar. Passou a coletar depoimentos de estudantes de instituições públicas e privadas. Queria saber como esses alunos se sentiam na escola. "O que notei foi uma incompreensão. O aluno não se sente o principal foco da escola", afirma. Nos depoimentos colhidos, João Jardim captou a diferença entre o modo como os alunos percebem a escola e seus professores e o modo como a escola e seus professores percebem os alunos. Há variações nessas análises, evidentemente, mas o problema se torna mais grave nas escolas públicas, onde, na maioria das vezes, as incompreensões se somam às deficiências materiais. A ambição de Jardim com esse filme é fazer do cinema uma sala de aula e usar a sala de aula como um cinema. Pretende ir além do circuito comercial e viver a experiência de criar um circuito educacional. "O filme seria exibido nas escolas, visto por pais, alunos e professores. [A intenção é] provocar o debate." A escola deveria fazer uma lição de casa: estudar melhor seus alunos.