São Paulo, terça-feira, 30 de agosto de 2005

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Caminho das Pedras

1 Fundada em 1957, a Internacional Situacionista era uma associação libertária de poetas e artistas europeus ligada aos surrealistas, aos letristas e ao Grupo Cobra. Tinha como integrantes Guy Debord, Michele Bernstein, Raoul Vaneigem, entre outros, que publicaram o jornal "Internationale Situationniste" (1958-1969) para propagar suas idéias.

2 Guy Debord, aliás, publicou "A Sociedade do Espetáculo" (1967), livro no qual desenvolve a teoria de que o espetáculo, entendido como o domínio da vida pelas imagens, encampou todas as outras formas de dominação. O espetáculo não compreende somente os meios de comunicação de massa -seu lado mais superficial- mas também designa uma sociedade na qual os seres humanos se vêem obrigados a contemplar passivamente as imagens, pois o real é fragmentário e banal. Muitas das frases escritas nos muros de Paris durante a revolta de 68 eram citações desse livro. Para compreender melhor esse assunto, entre no site do Archivo Situacionista (www.sindominio.net/ash/index.html).

3 No livro "Pop Art Redefined", Suzy Gablik atribui a Ray Johnson, o artista desconhecido mais famoso do mundo, os primeiros "happenings" (que ele chamava de "nothings") e as colagens usando xerox. Johnson criou uma rede internacional de arte postal, a Correspondance School, e começou a enviar cartões pelo mundo com a instrução: "Add to and return to Ray Johnson" ("acrescente e devolva para Ray Johnson"). O site www.artpool.hu/rayjohnson.html traz mais dados sobre esse artista.

4 O termo "event scores", inventado por George Bretch, um dos integrantes do Grupo Fluxus (www.ubu.com/film/fluxfilm.html e www.4t.fluxus.net), servia para designar ações abertas a um número infinito de interpretações mentais ou físicas. Fluxus é uma associação de artistas que se agruparam, no final dos anos 50, ao redor de George Maciunas -organizador dos eventos, teórico da identidade social e política do movimento e diretor das publicações. Brecht considera os "Fluxus events" como as menores unidades de uma situação.

5 Em Nova York, na década de 70, um office-boy chamado Taki começou a deixar seu tag -seu nome e o número de sua rua, "Taki 183"- pelas ruas do bairro Upper West Side, onde ele trabalhava. Em pouco tempo, o gesto de Taki gerou uma legião de seguidores. Essa nova forma de grafite desejava chamar a atenção para si como o produto individual de um sujeito. Nos anos 80, Jean-Michel Basquiat, Kenny Scharf, Keith Haring e muitos outros imersos na cultura das ruas deixaram seus tags e pinturas nos muros e metrôs. Das ruas e dos trens de Nova York, essas caligrafias se disseminaram para o mundo e foram copiadas, recriadas e modificadas de acordo com o contexto regional.

6 As manifestações coletivas "Apocalipopótese" (1968), ocorrida no Aterro do Flamengo, no Rio de Janeiro, e "Do Corpo à Terra" (1970), no Parque Municipal, nas ruas e ribeirões de Belo Horizonte, serão lembradas como eventos artísticos em espaço público paradigmáticos do Brasil do AI-5. Entre o final dos anos 70 e o começo dos 80, alguns grupos, como Manga Rosa, Viajou Sem Passaporte ou 3 Nós 3, utilizaram muros, praças e outdoors para mostrar suas obras. Alguns desses trabalhos podem ser vistos no site do Instituto Itaú Cultural (www.itaucultural.org.br).

7 Em setembro de 1983, em Buenos Aires, na Terceira Marcha da Resistência, convocada pelo Movimento das Mães da Praça de Maio, os manifestantes levaram para a praça -ou desenharam lá- silhuetas humanas de tamanho natural. Essa ação, iniciativa dos artistas Rodolfo Aguerreberry, Julio Flores e Guilhermo Kexel, propunha que os manifestantes marchassem com as silhuetas e, mais tarde, colassem as imagens nos muros. O evento, conhecido como "El Siluetazo", teve enorme repercussão na imprensa e foi reiterado nas marchas subseqüentes.

8 No outono de 2000, o Colectivo Sociedad Civil chegava à Praça Maior de Lima, no Peru, ao meio-dia. Os integrantes carregavam bacias vermelhas de lavar roupa, sabões da marca Bolívar, cordas e bandeiras peruanas de todos os tamanhos. O povo fazia fila para ensaboar, enxugar, esticar e estender a sua bandeira nos varais colocados nos jardins. O evento "Lava a Bandeira" se estendeu por meses até a renúncia e fuga de Fujimori.

9 Algumas leituras são essenciais para entender esses procedimentos, entre elas "Assalto à Cultura" (200 págs., R$ 25), de Stewart Home, "Panegírico" (88 págs., R$ 17), de Guy Debord, "Manifestos Neoístas" (216 págs., R$ 22), de Stewart Home, "Estamos Vencendo - Resistência Global no Brasil" (176 págs., R$ 35), de Pablo Ortellado e André Ryoki, e "TAZ - Zona Autônoma Temporária" (88 págs., R$ 17), de Hakim Bey, todos da editora Conrad.

10 Para conhecer obras de artistas e grupos que trabalham com intervenção urbana na contemporaneidade, aqui vão algumas sugestões de sites. O Grupo Poro (www.poro.redezero.org), de Belo Horizonte, faz indistintamente intervenções políticas, ecológicas e poéticas. Em São Paulo, o Grupo Bijari (www.bijari.com.br) fez intervenções na última Bienal de Havana e em várias cidades do Brasil. Já o programa FPES (Formas de Pensar a Escultura), coordenado por Maria Ivonne dos Santos no Instituto de Arte da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (www6.ufrgs.br/escultura), já produziu diversas ações, algumas delas na terceira edição do Fórum Social Mundial, em Porto Alegre. Pobres Diablos (www.pobresdiablos.com.ar) é um grupo de Rosário, na Argentina, formado por Ana Wandzik, Marcela Sacco e Pablo Galarza, que realiza arte urbana como práxis política. Já o trabalho do Grupo de Arte Callejero (http://gacgrupo.tripod.com.ar), de Buenos Aires, tenta subverter as mensagens institucionais vigentes para se infiltrar na linguagem do sistema e provocar pequenas falhas. A intenção é desmascarar ou fazer evidentes os mecanismos do poder. Grupos representativos de várias partes do mundo que desenvolvem uma reflexão sobre a experiência artística participativa por meio da intervenção no espaço público estão mapeados no site www.echelleinconnue.net.

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