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Com história política atribulada, situação econômica do país é motivo de piada na internet
Argentinos fazem chiste sobre crise atual
DO ENVIADO ESPECIAL A BUENOS AIRES
"El país estaba al borde del abismo y con Duhalde hemos dado
un paso adelante." A piada, que
circula na internet, mostra a descrença dos argentinos em relação
à recuperação de sua economia.
Enquanto o câmbio US$ 1=1 peso figurou na Constituição, o país
viveu um período de vacas gordas, ou falsamente gordas.
No fim do segundo governo de
Carlos Menem, a paridade peso/
dólar experimentou as intempéries da retração econômica e do
alto índice de desemprego, problemas que o tempo agravou.
Fernando de la Rúa, que sucedeu Menem, governou entre 1999
e 2001 e acabou caindo, engolfado
pela crise da paridade das moedas, que em dezembro deixou
rastros de sangue pelas ruas.
Hoje, o câmbio despenca para
quase US$ 1=4 pesos, enquanto
os argentinos têm à testa Eduardo
Duhalde, um presidente que ninguém elegeu e que peleja para
conseguir fechar um acordo com
o FMI e para tourear o desemprego que se estende à metade da população economicamente ativa
da Argentina (de cerca de 14 milhões de pessoas).
Mas, enquanto a paridade durou, a dolarização, adotada em
1991 para debelar a hiperinflação,
financiou a modernização de
Buenos Aires, mudando a face de
áreas urbanas como Puerto Madero (vejo texto à pág. F13).
UCR X peronismo
Dona de uma história política
atribulada, a Argentina, que tem
seu palácio de governo na Casa
Rosada (1884), conquistou a independência no início do século 19
-e tem na figura do general José
de San Martín seu "libertador".
San Martín, que era maçom e
por isso tem seu mausoléu num
anexo da catedral metropolitana
de Buenos Aires, foi o herói pátrio
que "triunfou em San Lorenzo
-1813", "afirmou a independência
argentina - 1816", "passou os Andes - 1817" e "levou sua bandeira
emancipadora ao Peru e ao Equador - 1817/1822", conforme está
inscrito no seu túmulo, guardado
pelos granadeiros, uma guarnição
de 200 soldados engalanados que
juraram fidelidade eterna ao poder constituído.
Nascido na Argentina e educado em Madri, San Martín atravessou a cordilheira na altura de
Mendoza, a 1.200 km de Buenos
Aires, com destino ao Chile, pelo
menos meia dúzia de vezes.
Um século depois da independência, em 1916, o país elegeu o
presidente Hipólito de Yrigoyen,
membro do partido União Cívica
Radical (UCR), considerado o
primeiro partido latino-americano das classes médias.
A UCR esteve no poder até 1930,
quando foi deposta por um golpe
militar. Dois anos depois, a democracia seria restaurada, pelo menos até a eclosão, na Europa, da
Segunda Guerra (1939-45).
Consoante com as figuras então
em voga nos países que gravitavam em torno do nazi-fascismo,
surgiu na Argentina, em 1943, um
novo líder político: o coronel Juan
Domingo Perón (1895-1974).
Perón, que, como subsecretário
de Guerra liderou o golpe contra a
Presidência de Ramón Castillo,
tornou-se, depois, caudilho. Sua
atuação foi tão determinante, que
acabou por mudar o panorama
partidário.
Evita
Mas Perón, que esteve presente
na vida política do país por quatro
décadas, deveu muito do seu sucesso ao carisma de Evita, nascida
Eva Duarte (1919-1952). Atriz de
rádio, Evita casou-se com ele. Em
1945, Perón finalmente tornou-se
ministro da Guerra e, a seguir, vice-presidente da República.
Apoiado na popularidade de
Evita, Perón venceu as eleições de
1946. Foi reeleito em 1951 e, no
ano seguinte, Evita morreu de
câncer, sendo aclamada como
"chefe espiritual da nação". Teve
então início uma crise política
que, em 1955, derrubou o governo, enviando Perón em 1961 para
o exílio na Espanha.
Em 1973, a Argentina estava
pronta para mais uma dose de peronismo. Héctor Cámpora, que
havia vencido as eleições, renunciou para abrir espaço para a volta
do velho caudilho, então casado
com Isabelita.
Juan Domingo Perón morreu
em 1974 e sua mulher, vice-presidente do país, governou até 1976,
quando outro golpe de Estado,
militar, mudou o rumo da política. Chefe da junta militar que tomou o poder, Jorge Rafael Videla
fechou o Congresso e iniciou a
"guerra suja", que fez água quando, em 1982, outro general, Leopoldo Galtieri, declarou guerra à
Inglaterra pela posse das ilhas
Malvinas.
O resto é história recente: a Argentina foi derrotada militarmente pelos ingleses, mas a democracia voltou a reinar em 1983, quando Raúl Alfonsín, da UCR, venceu
as eleições. Não conseguiu, no entanto, controlar a inflação e acabou abrindo espaço para os peronistas liderados por Carlos Saúl
Menem.
Líder do partido Justicialista
(peronista), Menem foi eleito e
reeleito e tentou mudar a Constituição para disputar a Presidência
por uma terceira vez consecutiva.
Em 2001, esteve preso sob acusação de tráfico internacional de armas e, agora, está novamente tentando voltar à cena política.
Há quem ridicularize suas intenções -e a internet, a propósito de fazer piada, também traz,
nesses dias de crise e de ameaça
de "contágio" da economia brasileira, uma frase atribuída a ele no
fim de seu segundo governo: "La
deuda que le estoy dejando al país
no es externa, es eterna".
(SILVIO CIOFFI)
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