|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
FERNANDO GABEIRA
Sonho do turismo não morre à beira-mar
Quando estourou a nova
onda de violência no Rio,
discutíamos num seminário o futuro do turismo no Brasil.
Ônibus e carros ardiam, supermercados eram saqueados, e calculávamos como fazer com que
em quatro anos dobrasse o número de visitantes no país.
Quase nos imolamos na fogueira do pessimismo, quando soubemos das notícias do dia e de sua
repercussão internacional. A paz
e a beleza natural do Brasil não
querem dizer nada aos turistas se
eles forem informados desses choques de rua.
A análise dos fatos mostra que
nem tudo está perdido. Tanto a
violência como a poluição das
praias poderiam ser reduzidas se
houvesse uma política correta.
Neste momento de pânico, a turma do mata e esfola ganha evidência. Políticos e jornalistas sabem que o público está emocionado e muitos propõem mais repressão, pois sabem que é um caminho real para a simpatia popular.
Minha posição, cada vez mais
minoritária e isolada, é a de que a
ênfase deveria ser dada a um sistema sofisticado de informação.
Falo com alguma experiência.
Em 1992, cobri a sucessão de saques no Rio.
Com um pouco de sensibilidade
e um desses ousados motoristas
de jornal, conseguia chegar aos
saques no momento em que aconteciam ou, algumas vezes, até um
pouco antes. A Polícia Militar me
acusou de organizar o movimento, porque subestimava a informação e achava impossível chegar tão pontualmente.
No período da luta armada, jamais circulariam cinco homens
num só carro, pois a hipótese de
serem parados pela polícia era
muito grande.
No Rio, a julgar pelos relatos,
eram 50 homens armados deslocando-se pelas ruas. Em poucas
grandes cidades do mundo um
movimento dessa envergadura
não seria detectado. Desde o domingo à tarde, circulavam boatos
nas comunidades indicando que
alguma coisa iria acontecer.
Muitos sonham com o Exército
nas ruas. Mas não é essa a maior
contribuição das Forças Armadas. O ideal seria tencionar todos
os órgãos de informação num trabalho solidário. E avançar um
pouco na tecnologia da informação e da segurança, ambas indústrias multimilionárias.
Aqui em Brasília é fácil encontrar gente querendo vender sistemas integrados, novas técnicas. A
oferta está aumentando à medida que as empresas sentem que
esse mercado da segurança é um
dos mais promissores.
Combinar o uso da informação
com recursos tecnológicos modernos não vai acabar com o tráfico
de drogas. Nem despoluir as
praias vai impedir que em dias de
tempestade muita sujeira se desloque para o mar. Ambas, no entanto, são tentativas de acabar
com essas ondas de indignação
com medidas de curto prazo.
Também é evidente que, resolvidas as duas coordenadas, os turistas não se voltarão em massa
para o Brasil. Outras condições
precisam ser preenchidas. Fica difícil formular uma política nacional para atrair 8 milhões de pessoas sem que setores como ambiente e segurança pública sejam
integrados.
Uma política de turismo já é
complexa demais em si mesma.
Lula é um entusiasta do avanço
dessa indústria no Brasil. Lembro
que em suas férias em Búzios, antes do início da campanha, o único compromisso público que aceitou foi participar de um seminário sobre ecoturismo.
Infelizmente os pepinos se acumulam, e a gente nem sempre pode manter o foco no turismo. Agora é a hora de formular uma política adequada.
Há estudos, como o de Cang-Seen Ooi, que se concentram no
turismo cultural, há exames de
planejamento em vários países
feitos por William G. Gartner e,
entre muitos outros numa rica bibliografia, até ensaios sobre sexualidade e turismo, como o estudo sobre visitantes gays em Amsterdã de H. Hughes no livro "Managing Tourism in Cities".
Uma boa notícia é que o Parlamento deverá ter uma comissão
permanente para debater o turismo. Pelo menos será mais um pólo de formulação e de ajuda aos
centros de implementação tanto
em escala federal como local.
Essa ajuda é vital. Uma das possibilidades é criarmos um serviço
só para orientar iniciativas locais.
Contribuir com cada região interessada em explorar seus recursos
turísticos. Esse núcleo é uma dessas coisas que sinto que posso botar de pé, embora ainda não saiba como, se em forma de ONG ou
de um instituto. Vamos primeiro
ao software; depois compramos
mesa, algumas cadeiras, um computador e um telefone.
A meta de dobrar o número de
turistas em quatro anos é possível, apesar dos incêndios. Algo
que Lula poderia admitir logo é
que o turismo, além de abrir empregos, traz divisas e se qualifica
com isso aos mesmos estímulos
fiscais do setor exportador. Seria
um belo pontapé inicial.
Texto Anterior: Litoral paulista: Banana diferencia peixada em Ubatuba Próximo Texto: Panorâmica - Intercâmbio: Salão do Estudante percorre o país Índice
|