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JÓIA DA BOÊMIA
Cidade é dona de um complexo conjunto arquitetônico que combina traços medievais, góticos e barrocos
Praga floresce por meio de luz e sombras
ANTONIO ARRUDA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM PRAGA
Acomete-nos uma espécie de
deslumbramento permanente: a
"jóia de pedra", como a denominou Goethe, impressiona a todo
momento. Estar em Praga é como
vivenciar muitos tempos ao mesmo tempo, desvendar muitos lugares em um mesmo lugar, rememorar uma história sem tê-la vivido. Rara cidade que a guerra não
demoliu por completo, a capital
da República Tcheca conserva intactas antigas construções -castelo, palácios, catedrais, igrejas e
conventos, museus, salas de concerto, pontes e viadutos, torres,
cemitérios.
Praga é um museu a céu aberto,
tamanha a completude do conjunto arquitetônico. Os olhos, assim, surpreendem-se a cada instante com o que é imponente: a
enorme catedral São Vito, no castelo de Praga, a Casa Municipal,
com seu ouro e suas pinturas, ou a
torre gótica que fica no fim da
ponte São Carlos.
Mas também os olhos param
diante de portas, janelas e escadas. Praga nos faz andar com a cabeça alçada ao céu, admirando as
torres e os cumes das catedrais, ao
mesmo tempo que nos faz fixar os
olhos em um detalhe de uma pintura, em um lustre de um saguão
de teatro ou em um piso de uma
sala de concertos.
Espalhadas ora entre, ora sobre
as construções, estátuas parecem
vigiar a todo tempo o viajante. A
cada curva ao fim de uma rua estreita e de paralelepípedos é possível se deparar com um exemplo
da arquitetura medieval, uma escultura barroca, uma ponte do século 15 e por aí adiante (ou para
trás, se for o caso de conhecer
uma sinagoga do século 13).
Sinfonias da primavera
Cortada pelo rio Vltava, Praga
pode ser dividida em seis partes
principais: Josefov (bairro judeu),
Staré Mésto (Cidade Velha, onde
está o centro), Nové Mésto (Cidade Nova) e Vysehrad, que ficam
na margem direita do rio; e Malá
Strana (a Cidade Pequena, onde
todas as construções são anteriores ao século 19) e Hradcany
(bairro onde fica o castelo de Praga e onde foi fundada a cidade),
que estão na margem esquerda.
Ainda que um dia em cada região
dê para conhecê-las bem, sempre
fica o gostinho de voltar no dia seguinte para o mesmo lugar, para
descobrir novos edifícios ou contemplar as estátuas de uma igreja.
Esteja em qual região estiver, o
turista dificilmente vai dar mais
de cem passos sem que veja um
cartaz anunciando uma ópera ou
uma sinfonia. Dois teatros centralizam as apresentações de ópera: o
Teatro Nacional (www.nationaltheatre.cz) e a Ópera Estatal de
Praga (www.opera.cz).
Praga respira música: é berço de
compositores como Antonín
Dvorák (1841-1904) e Bedrich
Smetana (1824-1884), músicos
que investiram nos temas tchecos
e os divulgaram em suas peças. A
capital acolhe mais de dez salas de
concertos (além das igrejas, cerca
de 15, onde também acontecem
apresentações de música erudita),
sete casas de shows e, no verão,
seis grandes jardins viram palco
de concertos ao ar livre.
Mas é na primavera -época
em que a temperatura amena e as
flores animam ainda mais os turistas- que a cidade se torna um
dos principais centros mundiais
de música erudita. O Festival Internacional de Música de Praga,
também conhecido como Festival
da Primavera, que neste ano
acontece de 2 de maio a 4 de junho, reúne a nata da erudição
musical de todo o mundo: da sinfônica de Londres à filarmônica
de Praga, o turista pode conferir
peças famosas e também de jovens compositores, executadas
por músicos da mais alta estirpe
(é possível conferir a programação e reservar ingressos pelo site
www.festival.cz).
Não bastasse, há na cidade mais
de 30 teatros (incluindo o de marionetes, o Black & Light Theatre
e o Laterna Magika), a mesma
quantidade de museus, além de
mais de 15 galerias de arte. Mas
também nas ruas encontram-se
muitos artistas -pintores e músicos-, e não dá para desconsiderar as feiras de artesanato, ricas
e diversificadas, com destaque para os ovos (de madeira, de tecido,
de porcelana, todos ricamente
trabalhados), as marionetes, as
pequeninas bonecas russas, as
caixas marchetadas e os brinquedos de madeira.
Durante a noite, a luz nas ruas é
pouca (não concorre, assim, com
a iluminação dos edifícios e das
estátuas), o que faz de Praga misteriosa e sombria. Pareceria óbvio
dizer que o clima torna-se kafkiano durante esse tempo, mas, nesse caso, o óbvio torna-se o incomum: não é sempre que se pode
sentir em uma atmosfera kafkaniana estando na terra natal de
Franz Kafka.
Quando já não há mais música
nas ruas e o burburinho dos turistas é bem menor, no silêncio quase absoluto, a ponte São Carlos e
suas 30 estátuas, o rio Vltava, o
gótico portão de Pólvora, as torres
da São Vito, ao longe -tudo parece um grande cenário de um sonho onde, agora, também se tem
momentos de temor. Mas, ali,
mesmo a temeridade parece nascer da beleza. E, ainda mais do
que bela, Praga é uma anciã que
conta histórias e guarda segredos
e tesouros que há milênios vêm
construindo a humanidade.
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