São Paulo, segunda, 8 de fevereiro de 1999

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MAMA ÁFRICA
Mandela lutou pelo fim do apartheid, ajudando a fazer da África do Sul um dos destinos mais procurados
Príncipe fixou país no mapa do turismo

SILVIO CIOFFI
Editor de Turismo

Nelson Mandela, 80, foi o primeiro. Desde a adoção, em 1948, do apartheid -a política segregacionista adotada para garantir a manutenção do poder pela minoria branca- a África do Sul nunca havia participado de eleições livres.
Líder do Congresso Nacional Africano (CNA), a maior organização negra do país, Mandela era um advogado da etnia xhosa (pronuncia-se "côssa") quando foi detido - e amargou 27 anos de prisão.
Até sua libertação, pressões internacionais censuravam viagens turísticas, mas, findo o apartheid, a África do Sul logo entrou no circuito dos roteiros mais cobiçados.
Mesmo um ano antes das eleições, em 1993, quando Mandela e o então presidente Frederik De Klerk dividiram o Nobel da Paz, o mundo já antevia que esse país, caracterizado por enorme diversidade geográfica, histórica e biológica, se tornaria uma meca turística.
Passados os tempos duros do apartheid, a África do Sul amarga problemas sociais -ainda que seja responsável pela metade da produção industrial do continente africano e a primeira produtora mundial de ouro.
Localizado no sul do continente e banhado pelos oceanos Atlântico e Índico, o território sul-africano tem 1.223.201 km2 e 43,3 milhões de habitantes, dos quais 70% são negros (com predomínio para as etnias zulu, 20,5%, e xhosa, 18,%).
Seus habitantes de origem européia somam 12% da população (muitos deles são descendentes de holandeses, ingleses, alemães e franceses). Também são grupos populacionais importantes os euroafricanos (13%) e os indianos (3%), esses últimos mais facilmente encontrados nas cidades banhadas pelo Índico, como Durban.

Intolerância histórica
Embora o apartheid tenha sido oficializado em 1948, foi a partir de 1911 que a minoria branca promulgou as primeiras leis garantindo seu domínio sobre a população negra, que foi impedida de possuir terras e votar, ficando confinada a determinadas áreas residenciais.
O CNA, organização fundada em 1912, só viria pregar desobediência civil ao apartheid nos anos 50.
Nelson Rolihlahia Mandela, que também era um príncipe em sua etnia, ajudou, na juventude, a fundar a ala militar dessa organização.
Depois de 27 anos encarcerado, tornou-se símbolo das lutas de libertação. E foi somente com a eleição de Frederik de Klerk, empossado em 1989, que o país começou a mudar. De Klerk revogou as leis raciais e libertou Mandela, eleito presidente na legislatura seguinte.

Mandela e o fim do apartheid
Etimologicamente, apartheid quer dizer "desenvolvimento em separado". Mas, se nos anos da colonização o termo designava o modo de produção em que os protestantes trabalhavam sem escravizar as populações negras, no momento seguinte o país vivia em regime de sórdida discriminação.
Antes disso a história sul-africana se confundia com a dos navegantes europeus que tentavam contornar o cabo das Tormentas e abrir caminho para as Índias, estabelecendo uma rota de comércio segura para obter especiarias.
O português Bartolomeu Dias (?-1500), que em 1487 contornou o cabo -depois chamado de cabo da Boa Esperança- foi o pioneiro. Descobriu a passagem do Atlântico para o Índico, tomando ciência da ocupação da região pelos índios bosquímanos.
Para valer, a colonização só foi iniciada pelo holandês Jan van Riebeeck (1619-1677), destacado funcionário da Companhia das Índias Orientais, que fundou a Cidade do Cabo, em 1652.
Com a interiorização do desenvolvimento, os zulus resistiram aos ocupantes bôeres, de origem holandesa, que, liderados por Shaka (1787-1828), organizaram seu exército. Dingane sucedeu Shaka e derrotou os bôeres, em 1838. Nessa ocasião, a máquina de guerra dos zulus tinha 50 mil guerreiros.
Mas foi o pioneiro político africânder Paul Kruger (1825-1904) que forjou a nacionalidade sul-africana. Kruger, que morreu no exílio na Suíça, lutou contra a anexação da região do Transvaal pelos ingleses, que dominavam a Província do Cabo.
A guerra entre os europeus, que opôs 500 mil soldados britânicos e 55 mil combatentes da República Sul-Africana e do Estado Livre de Orange, foi cruenta: entre outras riquezas, estavam em disputa as minas de ouro do Transvaal, presidido por Kruger entre 1883 e 1890.
Do outro lado da cena política branca, Cecil John Rhodes (1853-1902) foi o político e empresário britânico mais destacado.
Com saúde frágil, foi mandado ainda púbere para a Cidade do Cabo, onde fez fortuna com a descoberta de diamantes em Kimberley.
Disposto a forjar no sul da África um país de identidade britânica, Rhodes viajou para a Inglaterra e estudou em Oxford. De volta à Província do Cabo, tornou-se primeiro-ministro, fundou a empresa de diamantes De Beers e marchou para o norte, onde emprestou seu nome à Rodésia (hoje Zimbábue).
O general Louis Botha (1862-1919), que chefiou os bôeres contra os britânicos, também é figura de destaque e fundou, em 1888, a República Sul-Africana. Já o artífice do Partido Nacional, James Hertzog (1866-1942), entrou para a história pela porta dos fundos, editando as leis segregacionistas, que custaram a ser desmanteladas e forjaram outra biografia: a de Desmond Tutu, 68, que pregou a luta não-violenta contra o apartheid, ganhando o Nobel da Paz em 1984.



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