São Paulo, segunda, 9 de março de 1998

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NOVA INGLATERRA
Comunidade rural e puritana repelia o sexo até para procriação, mas não dispensava bens materiais
Shakers substituíam orgasmo por dólares

do enviado especial a Massachusetts

Para os moradores da comunidade Hancock, que funcionou no Estado de Massachusetts entre 1790 e 1960, a ética protestante representava realmente o espírito do capitalismo -a tese mais conhecida do sociólogo Max Weber, para explicar a pujança econômica dos países protestantes, EUA à frente.
Hancock era uma comunidade rural, hoje tornada museu, habitada por membros da seita shaker.
Era uma comunidade tão puritana que não admitia o sexo nem sequer para procriação. Mas, em meio a um nunca acabar de regras, não fazia restrição nenhuma a avanços materiais.
Naturalmente, a relação entre uma comunidade como essa e o resto da sociedade era conflituosa. Mas isso não impediu o grupo de receber adeptos ao prometer "o paraíso na Terra".
Na verdade, o que eles ofereciam era muito trabalho, muita reza e conforto, proporcionado pelos bens materiais. Para os shakers, quanto mais conforto houvesse mais tempo livre haveria para louvar a Deus.
Há na casa principal avisos que denotam o severo relacionamento dos shakers com o dinheiro.
Visitas eram bem-vindas, mas deviam pagar pela hospedagem e comida. As roupas e objetos de uso pessoal eram, a rigor, propriedade da comunidade. Os produtos fabricados lá eram vendidos para as cidades vizinhas e gozavam de boa reputação no mercado.
A fé chacoalha os shakers
O próprio nome shaker diz respeito ao tipo de religiosidade que eles praticavam. "Shaker", em inglês, significa algo como "chacoalhante", e era assim, em êxtase, que eles ficavam durante os cultos.
A origem do nome é pejorativa -o nome oficial do grupo era Sociedade Unida dos Crentes na Segunda Aparição de Cristo.
Na comunidade, homens e mulheres trabalhavam. Eles se sentavam em bancos separados à mesa e para as reuniões e, claro, dormiam em quartos separados.
Regularmente, os companheiros de quarto eram trocados para que um membro da comunidade não nutrisse uma amizade especial por outro, graças à convivência prolongada. Como não praticavam sexo, os shakers tinham por hábito adotar crianças.
Hoje, o museu Hancock, em Pittsfield, oeste do Estado, procura reproduzir a rotina dos shakers no século 19 -inclusive com encenações "ao vivo". Em 1830, 300 pessoas viviam na Hancock. Havia 19 comunidades semelhantes nos EUA -uma ainda existe, em Sabbathday Lake, Maine, também na Nova Inglaterra.
Quando em 1960 a propriedade Hancock foi comprada por um grupo de pessoas da região interessadas nos shakers, moravam lá duas mulheres, as últimas representantes da comunidade.
São 20 prédios, onde o que chama a atenção é a simplicidade e o caráter funcional.
Os mais importantes são o casarão em que os fiéis viviam e o estábulo circular, de pedra, construído em 1826, um exemplo da arquitetura rural tradicional da Nova Inglaterra. (RODRIGO LEITE)



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