São Paulo, segunda-feira, 09 de dezembro de 2002

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Répteis pululam na região, ameaçando as pessoas

DA ENVIADA ESPECIAL À AMAZÔNIA

Se chegar bem pertinho dos jacarés gigantescos que habitam o lago do Cuniã diverte os turistas, a proximidade desses répteis não agrada aos moradores da reserva. Os extrativistas reclamam que a falta de manejo com essas espécies na região está colocando suas vidas em perigo.
Os caboclos relatam diversas histórias de acidentes com os jacarés-açus. As mães têm dificuldades para lavar roupa, as crianças não tomam banho no lago e os pescadores são frequentemente atacados pelos jacarés.
João da Silva, 57, pescador desde os 12 anos de idade, diz que já foi atacado por jacarés três vezes. "Tenho medo, a gente não pesca mais tranquilo. Uma vez estava com meu neto de dez anos pescando e, na hora em que a gente jogou a tarrafa, ele veio para cima, mas pegou a canoa", conta Silva, que chama o jacaré de "dragão".
Sua mulher, Maria Madalena de Araújo, 48, explica que é preciso ficar atenta quando está limpando peixe ou lavando roupa na prancha, à beira do igarapé. "O bicho fica rondando a gente."
Já o morador Francisco das Chagas Ferreira, 50, foi surpreendido pelo jacaré quando estava tomando banho no rio à noite.
Na casa da menina Deisa de Souza da Silva, 8, duas pessoas já foram atacadas. Por isso ela diz morrer de medo de pular nas águas das lagoas do Cuniã. "A mãe foi jogar tarrafa no igarapezinho, e o jacaré agarrou a perna dela. Com a minha irmã já aconteceu a mesma coisa há alguns anos", lembra Deisa.
De acordo com Jorge Ferreira Lopes, 40, presidente da associação de moradores da reserva extrativista, o homem e o jacaré disputam o peixe no Cuniã.
"O problema é que o jacaré não tem predador e se reproduz rapidamente. A comunidade está correndo risco por causa desses répteis, a maioria com cerca de três metros de comprimento", explica o presidente.
Lopes se preocupa com a necessidade de diversificar as atividades econômicas na região -a maioria das famílias vivem da pesca e poucas da produção da farinha. "Se continuar essa pressão no peixe, ele vai se tornar escasso. E, se o peixe acabar, o jacaré vai pegar o homem", completa o morador, que estima um número de 10 mil jacarés na reserva.
Segundo Atanagildo Matos, chefe do CNPT (Centro Nacional de Populações Tradicionais e Desenvolvimento Sustentável), o estudo do plano de manejo deve ser iniciado no ano que vem no Cuniã. "O predador do jacaré é o homem. Como lá os moradores não se alimentam da carne do animal [o que é permitido nessas áreas", ocorre um desequilíbrio. O jacaré coloca uns 40 ovos por ano."
Matos acha que uma saída é, depois do estudo realizado, fazer um criatório para comercializar esses animais de forma equilibrada. "Em vez de incentivar na reserva a criação de galinha, porco e carneiro, por exemplo, a idéia é criar capivara, caititu, paca e jacaré", completa o chefe do CNPT. (GR)


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